A primeira vez que ouvi Love Of My Life, lançada em 1975 pelo grupo Queen, senti como se meu coração estivesse se desfazendo. Na época era realmente o que estava acontecendo em função dos arroubos amorosos da adolescência. Desde então sempre que ponho meus ouvidos nos versos dessa canção sinto o dilacerar do peito. É aquela canção que sempre que bate a tristeza amorosa sempre volta a tocar nas minhas playlists.
Quando fui essa semana ver o filme Bohemian Rhapsody (2018) que conta a história de Freddie Mercury (Rami Malek) e seus companheiros, Brian May, Roger Taylor e John Deacon – que formaram o Queen – eu já esperava que viveria mais uma catarse. Mas foi além. Senti meu peito quebrar e as lágrimas saltarem aos meus olhos na intensidade dos versos mas não só de Love of my life. Não foram só as outras canções – umas que amo mais outras menos – que me fizeram ir às lágrimas (sim, eu prefiro as canções do Queen mais melancólicas).
Por ser um filme de uma pessoa pública Bohemian Rhapsody surpreende pela forma e não pelo conteúdo. Afinal, já sabemos todas as histórias da vida do vocalista do Queen. Dos sucessos aos problemas tudo é público. Ou seja, já vem com um spoiler natural. Contudo, saber a história não significa não se emocionar com ela. Foi exatamente o que aconteceu comigo.
O filme coloca luz sobre questões da vida de Freddie que são – obviamente – ofuscadas pela sua voz impactante. E talvez seja esse o maior ponto emotivo de quem, assim como eu, não parou de chorar durante o filme. A difícil aceitação familiar de um homem gay vivida por Freddie é a mesma que acontece em muitos lares de pessoas LGBTs. Esse, apesar de não ser o ponto central da trama, permeia os 135 minutos e rodearam toda vida pública do artista que foi batizado de Farrokh Bulsara.
Ele nasceu na colônia britânica Cidade de Pedra, em Zanzibar (hoje parte da Tanzânia), seus pais, Bomi e Jer Bulsara, eram parsis zoroastrianos de Guzerate, na Índia. Mas, se mudaram para Londres para que Bomi pudesse manter seu emprego no Banco Colonial Inglês. Vivendo na família tradicionalista, Freddie amordaçava seus desejos e não deixava florescer sua essência. Para viver sua vida precisou fazer rupturas, se condenar, se penalizar! Se reconhece?
Ali, sentado na cadeira do cinema, me senti na mesma conexão vivida por ele. Quantos de nós não tiveram que lidar com os olhares de reprovação dos nossos pais? Quantos de nós não se sentiram desconectados das nossas famílias? Como esquecer a sensação de ser preterido? A sensibilidade do olhar do ator Rami Malek nas cenas familiares de Freddie conseguem fomentar uma sintonia com quem já possou por cenas semelhantes. A vontade era de entrar na tela e abraçá-lo.
O amor de Freddie e Mary Austin- a mulher com quem ele namorou e para quem ele escreveu Love Of My Life – é outra pedrada na alma dos corações sensíveis durante o filme. A história dos dois é um dos capítulos mais intensos da história do rock. Eles namoram por seis anos, quase se casaram. O amor entre os dois é algo invejável. Transcendeu a relação afetiva ‘heteronormativa’. Em Mary ele tinha acolhimento, amparo e amor – de verdade! Impossível não sentir vontade de ter ao lado alguém como ela. Ou ele a ela. “Todos os meus amantes me perguntavam por que eles não conseguiam ocupar o lugar de Mary, mas é simplesmente impossível”, disse o vocalista em 1985. Como não querer esse amor?
Apesar do efeito emocional em muitos fãs a cinebiografia comete equívocos em pontos importantes da vida do artista. Têm sido duras as críticas da mídia especializada a forma como é revelada no filme que o cantor era soropositivo. No filme o diagóstico é usado com um dos motivos pelos quais Freddie busca um reencontro com a banda para fazer o Live Aid, em 1985. Contudo, ele só diagnosticado com a doença em 1987. Ou seja, é importante ver o filme pela sua fruição estética e de representatividade, mas por se tratar de um personagem real pesquisem para evitar disseminar incoerências.
Em tempos de intolerância e preconceitos exacerbados ver Bohemian Rhapsody lotando salas de cinema pelo mundo é uma realização de todos aqueles que lutam pela diversidade. Queen e Freddie estiveram no seu tempo de olho em outra dimensão. Subverteram cores e formas. É um recado claro à sociedade mundial: a diversidade não é moda! É essência e não se apagam as essências.
Ah, e quando for ao cinema leve lenços de papel. Se o seu coração for de manteiga igual ao meu certamente você vai precisar. Quando sair de lá continue ouvindo Queen. A voz de Freddie merece ser eternizada para sempre. Ouça e escolha a sua música. Eu, como já deixei claro aqui, sou apaixonado por Love Of My Life.
Apesar dele ter feito ela para Mary acho que, no fundo, ele fez essa canção para nós….. É um manifesto para que nunca nos esqueçamos que o amor, quando é verdadeiro, ele transcende o tempo, o corpo e alma. O ‘amor da vida’ se é da vida mesmo não acaba. O amor é perene. É eterno. Ele pode até mudar de forma, mas se for amor é para sempre. Se não for para sempre é porque foram apenas ilusões de um querer disfarçado de amor. Infelizmente, no mundo, há poucos Freddies e Marys.
Pelo menos existem os versos das canções com Love Of My Life…
…e a emoção do amor de Freddie >>>