A maquiadora Marcya Andrade trabalha todos os dias da semana nos últimos 8 meses com um objetivo: juntar R$ 15 mil para realizar o sonho de poder se olhar no espelho e se enxergar como realmente ela é. Transexual, Marcya deseja fazer procedimento cirúrgico para adequação de gênero, mas não há nenhum local na Bahia que faça o procedimento de forma gratuita. O esforço dela e de outras pessoas transexuais (que se identificam com o gênero oposto ao do nascimento) e travestis que desejam fazer procedimentos cirúrgicos e hormonais poderia ser menor se não fosse a burocracia.
Desde novembro de 2016 está sendo analisado pelo Ministério da Saúde a habilitação do ambulatório transexualizador do Hospital Universitário Professor Edgar Santos (Hupes), na Bahia. Contudo, segundo o MS, não há previsão para que o procedimento seja concluído.
“Há pendências no processo e já solicitou à Secretaria Estadual de Saúde do Estado que fizesse as adequações necessárias, para dar andamento ao processo. O Ministério ainda aguarda resposta do gestor local com as devidas adequações para dar andamento ao processo de habilitação”, disse em nota ao CORREIO.
O documento que falta, segundo a Secretaria da Saúde do Estado da Bahia (Sesab) é o alvará sanitário, que está sendo analisado pela vigilância sanitária estadual. De acordo com a Sesab, quando funcionar, é provável que o ambulatório trabalhe com uma lista única de marcação para permitir que a população dos 417 municípios possa ter acesso ao serviço. Essa foi uma das exigências apontadas pelo MS depois que foi feito o pedido de habilitação o que também atrasou o prazo de inauguração que deveria ter sido em janeiro deste ano.
Enquanto o ambulatório não sai no papel as pessoas travestis e transexuais precisam, assim como Marcya, juntar dinheiro para fazer procedimentos cirúrgicos, ter atendimento hormonal, terapêutico e psicológico. As cirurgias não são obrigatórias para que uma pessoa seja trans, mas a maioria faz os procedimento por questões de identidade de gênero e saúde.
Foi o que aconteceu essa semana com o estudante de Jornalismo, Théo Meirelles, que precisou fazer uma campanha pelas redes sociais para arrecadar R$ 10 mil para fazer a retirada dos intrusos (como os homens trans chamam os seios). “Só quero sentir esse corpo como se fosse meu”, disse Théo quando lançou a campanha.
Responsável pela implantação do ambulatório Transexualizador do HUPES – UFBA, a médica endrocinologista Luciana Barros Oliveira, ressalta que a população de travestis e transexuais do estado da Bahia vem sofrendo há muitos anos por falta de um serviço especializado no processo transexualizador.
“Não há endocrinologista na rede SUS para orientar a hormonioterapia de forma segura e individualizada, assim como não são realizados procedimentos cirúrgicos previstos na portaria do Ministério da Saúde sobre o processo transexualizador para travestis e transexuais. O ambulatório que será implantado no Hupes irá suprir essas deficiências na atenção à saúde desta população do nosso estado”, argumenta.
A demora na habilitação do Hupes para atendimento no processo transexualizador faz com que as pessoas continuem se auto-medicando, conforme explica a mnédica. “A falta de acesso aos procedimentos cirúrgicos prolongam e aumentam o impacto emocional que a inadequação do corpo à identidade de gênero do indivíduo acarreta”.
A realidade da Bahia é diferente de outros estados. Só neste ano já foram habilitados quatro novos serviços para procedimentos ambulatoriais de processo transexualizador, nos estados de Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná. Hoje, são nove no país que fazem terapia hormonal e cirurgias.