Se você gosta de Carnaval, é bem capaz de estar pensando nas fantasias ou no estoque de glitter para curtir a folia. Mas, se você é mulher, há também outra preocupação: o assédio sexual, recorrente nas festas populares.

Pensando nisso, mulheres estão se movimentando e fazendo com que campanhas contra esse tipo de violência tenham ainda mais força no Carnaval de Salvador. A ação Não é Não ganhou visibilidade em todo país e já garantiu a distribuição de 15 mil tatuagens temporárias com a mensagem pelas ruas da capital baiana. Mas a campanha pode ainda ter mais 10 mil adesivos e, por isso, continua arrecadando fundos em um financiamento coletivo no site benfeitoria.com/naoenaoba até esta sexta-feira (15), às 23h59 (horário de Brasília).

Para divulgar a ação, o coletivo local Não é Não preparou um ensaio fotográfico com mulheres reais no bairro do Santo Antônio Além do Carmo, em Salvador. Tem gorda, magra, negra, branca, loira, morena, cacheada, lisa, lésbica, hétero, bi, trans e cis. Divulgados em primeira mão pelo Me Salte – e com apoio do canal da diversidade do jornal CORREIO – os cliques foram feitos pela fotógrafa Ítala Martina (@italamartina/@subversao) e contam com a participação das psicólogas Ariane Senna e Natália Monteiro; da modelo e empresária Bell Rocha; da estudante e militante Gabriela Marx; e da jornalista Naiana Ribeiro. Veja as fotos logo mais (clique para ampliar) e conheça as fotografadas mais abaixo.

Além de lutar contra o assédio, promover a igualdade de gênero, empoderar e unir as mulheres, as fotos disseminam a campanha para que mais tatuagens possam ser distribuídas na capital nordestina com mais casos de violência contra mulher, segundo pesquisa recente da Universidade Federal do Ceará (UFC).

Os dados chamam atenção para a importância de campanhas como essa não só em Salvador como em cidades de todos estados.

Na terra do dendê, uma mulher é agredida a cada 56 minutos. Já no Brasil, uma em cada três mulheres relatam já ter sofrido algum tipo de violência ao longo da vida, segundo a ONU Mulheres. De acordo com dados da organização internacional de combate à pobreza ActionAid, 86% das brasileiras já sofreram assédio em público.

Os números só evidenciam situações cotidianas – que não têm hora e nem local para acontecer – e que atingem quase todas as mulheres. Com as fotografadas da campanha não foi diferente: em duas horas de ensaio fotográfico, foram mais de cinco casos de assédio. Teve homem fazendo ‘piada’, fiu fiu, toque sem consentimento e até olhares obscenos. Vale lembrar que tudo depois do ‘não’ é assédio. Também é assédio se alguém fala ou faz atos obscenos para você; quando você fica sem reação ou não consegue dizer “não”; quando você não sabe o que está acontecendo; quando você não pode dizer “não” por questões financeiras ou por outras relações de poder; se você está inconsciente ou desacordada.

“Consequência de uma sociedade machista e patriarcal, as violências contra as mulheres afetam diretamente na qualidade de vida delas, quando não nos tira a vida”, ressalta a secretária de Políticas para as Mulheres do Estado da Bahia (SPM-BA), Julieta Palmeira.

Seguindo as diretrizes da Organização Mundial da Saúde (OPAS/OMS), a médica titular da pasta considera que o assédio sexual é uma questão de saúde pública e lembra que assédio é qualquer comportamento indesejado praticado com reiteração e que afeta a dignidade da pessoa ou criar um ambiente hostil. “Campanhas como essa sensibilizam a população, mas sentimos que as mulheres passam a ter também uma transformação individual. Quando as mulheres são protagonistas dos seus próprios corpos, isso lhes traz mais bem-estar”.

Através do ensaio, também ficou claro que, quando mulheres se juntam, é possível se fortalecer e lutar contra as violências e abusos cotidianos. “Participar do projeto foi incrível, mas o melhor foi a vivência dessa tarde juntas. Passamos por muitos episódios de assédio e teve muita troca antes disso, durante e o tempo inteiro. Enquanto a gente se maquiava, tirava as fotos, descansava, cada uma foi contando um pouco da sua vida, sua experiência com histórias de assédio, e a gente foi compartilhando e se identificando. Cada uma pôde ensinar muito uma pra outra. Esse pouco tempo foi intenso e cresci muito convivendo com as meninas. Saí desse projeto uma outra pessoa”, revela a estudante de fisioterapia e militante Gabriela Marx, 24 anos.

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Gabriela Marx: ‘A tarde foi intensa e incrível’ (Foto: @italamartina)

Quem também conta ter saído outra pessoa das fotos no Santo Antônio foi a modelo plus size e empresária Bell Rocha, 29. “Gostei de ouvir outras mulheres com corpos e vivências diferentes da minha”, comenta.

Além de ter sido uma experiência profissional divisora de águas na sua carreira, a fotógrafa e publicitária Ítala Martina, 23, avalia que a sessão foi muito mais do que um ensaio fotográfico. “Graças à diversidade desse grupo, criou-se um espaço acolhedor de troca sobre as dores que cada uma de nós vivenciamos, principalmente para reforçar que estamos todas em volta de uma mesma luta. Eu valorizo muito esse momento de troca dentro de grupos diversos porque nos força a enxergar fora da nossa bolha”, pontua.

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Ítala Martina: fotógrafa e publicitária responsável pelos cliques do ensaio local da Não é Não   (Fotografia: @subversao)

A psicóloga Natália Monteiro, 28, também amou a diversidade das fotografadas e as conversas que emergiram desse encontro. “A sessão de fotos permitiu uma troca instantânea de relatos e experiências e também nos uniu enquanto mulheres, pois todas sofremos opressões, inclusive durante o ensaio. Houve muito acolhimento e escuta, o que dentro da diversidade é o que realmente faz a diferença”, resume.

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Natália Monteiro: psicóloga defende a emancipação das mulheres na sociedade  (Foto: @italamartina)

Unir as mulheres – com suas diferenças e individualidades – inclusive, criando uma rede de proteção no espaço público, é um dos objetivos da Não é Não. “Além de nos reconhecermos e mostrar que decidimos sobre os nossos corpos, ainda há reflexos nas questões de autoestima e de segurança na rua”, pontua a coordenadora local da campanha, Gabriela Guimarães, 26.

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Gabriela Guimarães: embaixadora da campanha Não é Não na Bahia (Foto: @italamartina)

A produtora cultural acrescenta que muitas pessoas ainda não sabem diferenciar paquera de assédio. Por isso, é preciso parar de normalizar esse tipo de aproximação, essa invasão de espaço, que os homens fazem no Carnaval. “É possível você paquerar, flertar com a pessoa no Carnaval, sem constranger, sem invadir o espaço do outro; sem tornar aquele momento feliz em um momento de angústia. Eu topei ser embaixadora da campanha por todas as situações que eu passo e já passei, que minhas amigas passaram. Acho que a gente não tem mais que enfrentar isso”, afirma.

Carnavalesca de berço, Gabriela enfrenta situações de assédio no Carnaval e em espaços públicos desde os 11 anos de idade. “É muito difícil passar por isso sendo muito jovem. A gente não compreende, começa a se culpabilizar, acha que a nossa roupa é o problema, que o lugar que a gente está frequentando é o problema. Mas o problema está, na verdade, no assediador – nesse tipo de violência. O Carnaval tem que ser bom pra todo mundo. Tem que ser respeitoso, tem que ser massa. A gente tem que sentir seguro”, pontua a embaixadora da Não é Não na Bahia.

E é essa segurança, inclusive, que a campanha prega. “Queremos espalhar essa mensagem e criar essa rede de apoio entre mulheres. Que nós possamos dar as mãos e de falar: ‘Eu tô do seu lado’. Gostaria de fazer um apelo para a mulher que veja outra passando por qualquer situação no Carnaval: pegue na mão dela e fale: ‘Miga, está precisando de alguma coisa? Vamos lá, sei lá quem chamou’. Fazer valer essa rede de apoio e se proteger é fundamental”, ressalta Gabriela.

Assim como a produtora cultural, a psicóloga Ariane Senna, 27, também frequenta a folia desde criança e sente na pele o assédio nos espaços públicos. “Muitos homens agarram, puxam o cabelo, dão um tapinha na bunda. Isso – para eles e suas companhias – está contextualizado em uma brincadeira. Mas muitas mulheres trans dizem ‘não’ e a agressão muitas vezes tem se tornado pior. Eles riem, chacotam, como aconteceu comigo em várias edições de Carnaval. A campanha traz muito essa mensagem de quando a gente disser não é ‘não’. A gente não está falando não porque somos tímidas ou porque estamos querendo que o outro tome iniciativa maior”, exemplifica.

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Ariane Senna: primeira psicóloga trans de Salvador (Foto: @italamartina)

Ariane considera essencial a amplificação da campanha, sobretudo porque as violações podem vir de quaisquer pessoas, independente de orientação sexual e identidade de gênero: “O assédio não ocorre apenas de um homem, cisgênero e heterossexual. O ‘não é não’ deve ser entendido para todas as pessoas. Por vezes, o assédio acontece com os homossexuais também – de um gay para outro; de um homem trans para uma mulher trans, de uma mulher lésbica para outra mulher lésbica. Isso é fruto do machismo estrutural. Infelizmente, todas nós somos vítimas disso e devemos estar atentas e lutar”.


Conheça as mulheres que participam da campanha

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Com 27 anos, a primeira mulher trans psicóloga de Salvador tem uma trajetória marcada por resistência e diz não ter dúvidas de que sua “existência é permitida por Deus e pelo universo”. Fruto de uma gravidez indesejada, seu pai abandou a mãe assim que ela veio ao mundo. Com cinco anos de idade, Ariane apresentou um quadro de desnutrição – foi aí que seus avós maternos resolvem a aceitar. Mesmo assim, cresceu em um ambiente hostil, no qual o irmão mais velho sempre teve mais privilégios.

“Eu venho desse ‘não lugar’,  ouvindo que estou ‘de favor’ lá. Aos poucos, foram acontecendo castigos que eu não entendia na época. Mas era porque eu já pegava toalha de minha mãe, passava batom, usava as bijuterias dela, pegavam bilhetinhos de paixão por um primo. Eu nunca tive que contar para a família que eu era trans – ou gay, na época – porque essas coisas foram aparecendo”, conta.

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Aos 13 anos, após ter passado por uma série de violências dentro do próprio lar, Ariane fui expulsa de casa. “Vivi na prostituição dos 13 aos 17 anos – período em que casei com o homem que me tirou da prostituição. Fiquei casada por dois anos, separei e retornei para prostituição novamente. Não que a prostituição seja algo ruim, mas acho que não deve ser a única opção. Como isso sempre me incomodou, nesse período tentei vagas de emprego no mercado formal – em lojas de shoppings de Salvador”, lembra a psicóloga.

Para isso, ela precisou se trajar com roupas tidas masculinas. “Quando eu ia como sou, enquanto Ariane, nunca era aprovada nas seleções. As experiências profissionais dessa época não passam de um ano porque – no anseio de sair da prostituição e de ter uma oportunidade – eu adentrava de forma masculina apenas para passar, mas não aguentava muito tempo e soltava o cabelo, por exemplo. A demissão sempre veio como forma de corte, mas não apontando como transfobia”, completa.

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Nessa mesma época, Ariane se apaixonou por outro homem – com quem morou por oito anos. Foi quando decidiu estudar psicologia na Faculdade Unime, na capital baiana, e se formou – tornando-se a primeira mulher trans psicóloga de Salvador.  Mesmo assim, ela sempre viu a psicologia de forma muito ortodoxa, heterossexual e branca. “Nunca tive espaço nela para colocar as minhas questões de identidade gênero e sempre vi um desconhecimento das próprias pessoas sobre essas discussões”, fala.

Após a graduação em psicologia, ela entrou no curso Bacharelado em Estudos de Gênero e Diversidade (BEGD), da Universidade Federal da Bahia (Ufba). “Estou fazendo justamente para ter esse arcabouço teórico para sustentar as minhas falas. Sempre senti essa falta de algo que me sustentasse na teoria para que as pessoas não ficassem me olhando apenas como alguém do lugar de fala”, completa Ariane.

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No meio desse curso, a psicóloga resolveu se inscrever no Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Estudos Étnicos e Africanos da Ufba e se tornou a primeira mulher trans a nesse programa de mestrado: “Acho que é uma resistência e uma inclusão, além de uma ação afirmativa importante também. Porque é um programa que tem um debate forte nas questões de raça e etnia, mas não tão forte de identidade de gênero. É algo muito novo, mas que está sendo muito bacana. Eu acredito que está sendo uma troca de aprendizados tanto pra mim quanto para o próprio programa e para universidade em si”.

A pesquisa de Ariane no mestrado tem como tema a Solidão da Mulher Trans, Negra e Periférica. A ideia do projeto nasce de uma inquietude própria dela – que muitas vezes é endeusada no viés sexual, mas tem afeto negado. Ao escrever sobre isso, a psicóloga busca que as pessoas entendam que não se trata de uma solidão que se resume ao afeto do homem ou de sexo, mas a uma lacuna gerada pela falta de uma rede de apoio emocional – que pode ser constituída por família, por amigos, etc.

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“Pesquiso isso porque é algo que sempre me incomodou e me incomoda muito porque a sociedade sendo machista coloca todas as mulheres, cis ou trans, em solidão. Já a solidão da mulher trans, negra e periférica passa por recortes de raça e de classe – o que dificulta ainda mais. O que eu pretendo nessa pesquisa é evidenciar, através de minha fala – já que se baseia em autoetnografia – e de outras pessoas trans, essa solidão que nos acomete de forma mais cruel. Porque, de um lado, estamos sendo excluídas e evitadas pelos homens, figuras masculinas que nos procuram e entre quatro paredes nos endeusam, mas que durante o dia a dia atravessam até a pista da rua para não passar do nosso lado. Justamente por temer ser visto como ‘menos macho’. As mulheres também nos evitam porque, no momento que transicionamos, entramos no sistema de competitividade feminina, consequência do machismo. As mulheres, cis ou trans, também passam a nos ver como uma ameaça. Nisso, a gente vai ficando excluída. Sem convites para dialogar, para estar junto. A socialização com as pessoas não ocorre de forma natural”, explica.

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Segundo Ariane, quando a mulher é trans, negra, pobre e periférica, a coisa ainda se atenua de uma forma maior porque, na maior parte das vezes, essas pessoas não tem recursos financeiros e logísticos de estarem nos espaços, de serem vistas: “E aí passam a ter suas imagens apagadas ou sendo sub-representadas por pessoas trans brancas que tiveram toda uma socialização masculina ou que já estão na universidade e que representam e falam em nome de todas as trans quando brigam por direitos como as cotas, por exemplo, e muitas vezes não sabem o que é isso”.

Me Salte: Como foi participar das fotos da campanha Não é Não?
Ariane: Participar do projeto foi mais uma oportunidade que Deus me permitiu e eu soube agarrar na hora certa. Diante de tantas violações que nós temos sofrido no ambiente de Carnaval e que eu mesma sofri, acho que essa é a hora de dar resposta para a sociedade na forma de campanha. A melhor forma de responder é através da educação. E informação é educação.

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Me Salte: O que mais te marcou nessa experiência?
Ariane: O que eu mais gostei foi a minha inclusão dentro do projeto enquanto mulher trans porque caímos ainda no erro de separarmos e pensar nas mulheres trans apenas em campanhas ligadas aos LGBTQ+, como se fossemos só isso. Na verdade, dentro das próprias letrinhas somos as mais distanciadas de representatividade por uma série de questões. Eu acredito que a campanha Não é Não funciona também para que as pessoas entendam o que é ser mulher. Gostei dessa diversidade: teve mulher trans, teve mulher preta e gorda, teve mulher branca e gorda, teve mulher lésbica, teve mulher branca e loira.

Essa diversidade faz com que possamos desmistificar o padrão do ser mulher e não pesar em quem sofre mais ou menos, mas que o assédio atinge todas as mulheres.

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Me Salte: Você já sofreu muito assédio? Teve alguma situação que te marcou muito?
Ariane: O que me marca muito sempre, no período do Carnaval, é esse medo real (de transitar nas ruas). Por minha mãe já ter presenciado diversas formas de violência comigo, ela mesma tem medo que eu vá e saia só. Isso me marca muito. É ver as pessoas se divertindo, dançando e eu ter sempre que me preocupar com segurança. Essa preocupação exacerbada com a segurança tem retirado a minha diversão. E eu sou uma pessoa divertida, que gosta de dançar… Foram várias violências que me marcaram muito. Puxões de cabelo, beijo na boca à força, sem o meu consentimento, apalpam minha coxa, minha bunda. Isso tudo faz com que as pessoas trans estejam sempre com uma corrente de amigos. A gente tem que respeitar as pessoas e deixar com que elas se divirtam. É essencial entender que o Carnaval é para todos, independente de raça, classe e gênero.

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Dona de um sorriso largo e de um jeito tímido, a modelo plus size, empresária e influenciadora digital Bell Rocha, 29 anos, chama atenção por onde passa. Com mais de 34 mil seguidores em seu Instagram e trabalhos fechados com marcas nacionais, ela é hoje uma das mulheres gordas com maior visibilidade do Norte/Nordeste.

“Minha história foi cheia de fases, mas quando eu entendi o poder e a capacidade que eu tinha eu fui muito longe. Com isso, comecei a entender que podia ajudar outras mulheres a entenderem que são capazes e que têm seu poder. E é isso que eu faço nas minhas redes sociais: encorajo outras mulheres. Foi para ajudar elas e fazer com que se sintam ainda mais maravilhosas, que criei a minha própria marca”, conta Bell, que é sócia da loja online Loja Bell Rocha. Por lá, são vendidos – sob encomenda para todo o país – biquínis e maiôs de todos os tamanhos.

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Quando questionada sobre a sua identificação com a campanha Não é Não, Bell diz que existe uma conexão total. “É uma campanha de extrema importância pra mim, que sempre fui assediada desde criança – embora não fizesse ideia do que era assédio na época”, conta. Bell considera que a campanha tem um potencial de alcance grande: “É importante para conscientizar mais mulheres do que é assédio. Acho válido também promover debates nas periferias, pois sabemos que lá muitas mulheres não têm acesso a muitas informações”.

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Me Salte: Como foi participar das fotos da campanha Não é Não? O que mais te marcou?
Bell:
Foi uma experiência incrível, gostei de ouvir outras mulheres com corpos e vivências diferentes da minha

Me Salte: Você já sofreu muito assédio? Teve alguma situação que te marcou muito?
Bell: Eu já sofri e sofro muito assédio. Na lista de piores que já sofri está um caso que aconteceu no Carnaval. Um homem me agarrou e eu precisei me agachar toda, praticamente deitar no chão, para que ele não me beijasse

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Militante desde a adolescência, a estudante de fisioterapia Gabriela Marx, 24 anos, se entendeu feminista cedo. Ela, que cresceu rodeada de mulheres guerreiras, sempre amou ter forças femininas por perto – seja nos trabalhos ou na vida pessoal. Sororidade e cuidado é com ela mesma. “Não me vejo na vida sem trabalhar com mulheres e não vejo minha vida sem as mulheres que me cercam”, resume.

Tudo começou de forma natural, quando Gabriela começou a se envolver com questões feministas e relacionadas aos direitos das mulheres no geral. “Meu corpo pedia isso. Desde essa época buscava entender mais, estudar mais, para discutir isso com minhas amigas, na sala de aula e com os meninos que estudavam comigo. Sempre militei nesse caminho”, conta a estudante.

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Com 20 anos, Gabriela se tornou doula e ativista de parto humanizado: “Me interessei muito pelos direitos reprodutivos e sou contra a violência obstétrica. Tenho um ativismo nessa área de nascimento, gestação e pós-parto. Me identifiquei muito com esse assunto, que acabou me levando para a fisioterapia”.

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Na vida pessoal, Gabi – como é chamada – teve que lidar com o preconceito da sociedade após se assumir lésbica e diariamente sofre repressões por ser mulher. “É impossível ser mulher e não se identificar com a campanha Não é Não. O assédio é algo que infelizmente cresce com a gente. Desde muito nova a gente começa a ser assediada – seja na escola, na família, etc. Também há pequenos assédios intrínsecos como o discurso de ‘senta direito’, ‘senta igual mocinha’, etc, que vão contribuindo para uma sociedade ainda mais machista. E, quando a gente vai crescendo, a gente tem que se deparar com mais violências e precisamos de uma campanha que lute contra esse tipo de coisa”, lamenta.

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A ativista acredita que, em uma festa popular como o Carnaval, deveria ser um direito das mulheres curtirem da maneira que elas quisessem, com a roupa que quisessem, que dançassem da maneira que quisessem, sem que ninguém incomodasse ou que falasse algo. “Mas, infelizmente, não é o que acontece. Como mulher, é impossível não se identificar porque faz parte da nossa vivência. Eu quero muito que tudo isso acabe. Não tem como não querer estar envolvida nisso”, afirma.

“A mensagem que a campanha passa é mesmo de desconstrução, sabe? De você sinalizar que você está ali, curtindo, e que sua roupa não é um convite; teu corpo não é um convite, não é domínio público, muito menos propriedade de homem algum. Que você está ali para se divertir, para curtir. Depois do ‘não’ tudo é assédio”

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Me Salte: Como foi participar das fotos da campanha Não é Não? O que mais te marcou?
Gabriela:
 Participar do projeto foi incrível, mas o melhor foi a vivência de passar essa tarde juntas. Acredito que todas nós ganhamos muito. Muitas de nós fomos assediadas – tiveram muitos episódios de assédio – e teve muita troca antes disso, durante e o tempo inteiro. Enquanto a gente se maquiava, tirava as fotos, descansava, cada uma foi contando um pouco da sua vida, sua experiência com histórias de assédio, e a gente foi compartilhando. Cada uma pôde ensinar muito uma para outra. Eu saí de lá uma outra Gabriela e cresci muito convivendo com as meninas. Esse pouco tempo foi intenso e incrível.

Me Salte: Você já sofreu muito assédio? Teve alguma situação que te marcou muito?
Gabriela: Sim. Não consigo lembrar agora situações mais antigas. Mas, recentemente, fui ao Festival de Verão com uma prima de 16 anos e a gente estava dançando e curtindo um show. Um cara chegou por trás querendo dançar comigo e eu não quis e falei que não queria, que estava incomodada e me afastei um pouco. Logo depois ele tentou dançar comigo de novo, chegando perto de mim e eu me afastei. Quando eu menos espero, o cara ficou com raiva que eu não quis dançar com ele ou, sei lá, que eu não quis beijar ele, e pegou seu copo de cerveja e jogou em mim. Molhou tudo: da cabeça aos pés. Eu lembro que fiquei tão puta, com tanta raiva. Estava lá, de boa, curtindo com uma prima, e só queria estar lá, em paz. E o cara estragou minha noite. Pra mim isso foi muito escroto, foi terrível.

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Dona de um olhar sensível e peculiar, a comunicóloga e fotógrafa Ítala Martina, 23 anos, é a artista que fez as fotos do ensaio da Não é Não na Bahia. Gorda e militante, ela tem uma história marcada por violências e restrições por conta de seu corpo. O auge da sua trajetória enquanto ser político começou quando ela passou a entender o significado do seu corpo social e descobriu que seu corpo não é um erro.

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“Toda essa inquietação me levou até meu projeto de Conclusão de Curso (TCC) em Comunicação, com habilitação em publicidade, pela Universidade Salvador (Unifacs), que consistiu em analisar e compreender como o estigma do corpo da mulher gorda acontece dentro do discurso publicitário”, conta Ítala.

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Todo esse processo acadêmico a fez atravessar um processo pessoal ainda maior: o de desconstruir a sua própria imagem. “Me levou a entender a importância da representatividade e da construção de amor pelo meu corpo”, destaca.

Hoje, recém-formada, a fotógrafa e publicitária criou um projeto intitulado Subversão, no qual cria novas narrativas sobre o belo: “Quero mostrar, através da fotografia, a beleza da singularidade de cada pessoa e ressaltar como a diversidade é bonita; entendendo, dessa forma, que nosso olhar e visão de mundo é condicionado por padrões impostos por instituições de poder como a indústria da moda e a mídia. Meu propósito, desde então, tem sido impactar as pessoas positivamente, estimulando-as a ressignificar suas concepções sobre autoimagem”.

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Me Salte: Como foi participar das fotos da campanha Não é Não? O que mais te marcou?
Ítala:
 Participar do projeto foi de grande importância para minha construção profissional nesse momento de reentrada no mercado da fotografia não só pela oportunidade em si, mas pela possibilidade em trabalhar com algo que eu realmente apoio e acredito. Para além da esfera profissional, esse momento de troca me acrescentou muito como mulher e como alguém interessada em novas perspectivas sobre a militância da mulher gorda. Graças à diversidade desse grupo, criou-se um espaço acolhedor de troca sobre as dores que cada uma de nós vivenciamos, principalmente para reforçar que estamos todas em volta de uma mesma luta.

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Me Salte: O que mais te marcou?
Ítala: Eu valorizo muito esse momento de troca dentro de grupos diversos porque nos força a enxergamos fora da nossa bolha. Nos possibilita não só a ocupar lugar de fala, mas também lugar de escuta – que nesse contexto atual, onde a internet nos possibilita voz, é importantíssimo para que nos acolhamos em nossas diferenças. Eu sou muito grata por toda essa oportunidade e tenho certeza de que saí disso uma mulher muito melhor que antes.

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Me Salte: Você já sofreu muito assédio?
Ítala: Sendo uma mulher gorda, sofri tipos diferentes de assédio moral, quando comparados ao que a maior parte das mulheres mais próximas do padrão sofrem – visto que o corpo gordo é lido como sinônimo de falência moral e de doença. É a empatia que nos faz ver como as lutas e dores são interseccionais, o projeto é um manifesto politico e de extrema relevância para todas as mulheres, visto que dá visibilidade há tantos casos de assédio negligenciados, e combate às estruturas como o machismo, que se enraizou dentro da nossa sociedade – transformando a mulher como objeto e por conseguinte, uma espécime de posse para os homens. A campanha Não é Não vem desmitificar e trazer à tona que as mulheres não estão mais dispostas a aceitar nenhum tipo de violência ou assédio, seja ele físico ou moral.

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Foi através da prática enquanto psicóloga clínica que Natália Monteiro, 28 anos, percebeu a necessidade de entender mais sobre feminismo. “As mulheres – mesmo sendo completamente diferentes – trazem consigo questões enraizadas pelo contexto patriarcal, machista, misógino… E são o grande público dos postos de saúde”, afirma a pesquisadora do Sagrado Feminino.

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Ao trabalhar na saúde pública de Belém (PA), Natália se viu num lugar de privilégio pois detinha informações que poderiam ajudar outras mulheres. “Afinal, a maioria não sabia se proteger, cuidar ou defender. Então senti necessidade de espalhar o conhecimento que tinha e, o que era para ser um grupo terapêutico para mulheres vulneráveis, acabou sendo a semente do meu projeto pessoal, a Aurora – Aliança de Consciência Feminina, um espaço virtual, no Instagram, onde público reflexões para ajudar no desenvolvimento dessa consciência”, conta Natália. Desde então, o projeto já ganhou corpo e foi pra rua – com ações que a psicóloga realiza pela cidade, como bate-papos, encontros e palestras.

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Tudo a ver com a essência dela: Tetti, como é chamada pelos amigos íntimos, adora explorar a cidade e tem uma forte conexão com suas crenças e festas populares. “Costumo dizer que eu sou a Aurora, pois ela faz parte do que eu sou como mulher, mas não sou só ela. A ideia é provocar reflexões, questionamentos, convidar as pessoas a se descobrirem na terapia e aproximar a Psicologia do cotidiano, sem necessariamente terem a minha figura como inspiração”, explica.

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Como psicóloga e feminista, Natália representa uma geração ativa e conscientizada e contribui para a construção de uma nova Psicologia, “ciência essa que considera e valida o contexto social ao qual estamos inseridas, mas que traz em sua história o machismo”: “Dessa forma, fazendo parte da campanha Não é Não, me vejo contribuindo na construção um novo modelo de cultura, baseado num pensamento feminista, que basicamente deseja a emancipação das mulheres na sociedade, a nossa liberdade de existir!”.

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Me Salte: Como foi participar das fotos da campanha Não é Não? O que mais te marcou?
Natália:
 Foi incrível dar vazão para um dos meus muitos lados! A possibilidade de me mostrar e desconstruir qualquer imagem “certinha” que a Psicologia possa fazer sobre mim enquanto profissional e exercitar a provocação que o Sagrado Feminino me traz, sobre abraçar minha completude e complexidade. Sou muitas em uma: psicóloga, foliã e tantas outras…
Eu amei a diversidade e as conversas que emergiram desse encontro. A sessão de fotos permitiu uma troca instantânea de relatos e experiências e também nos uniu enquanto mulheres, pois todas sofremos opressões, inclusive durante o ensaios. Houve muito acolhimento e escuta, o que dentro da diversidade é o que realmente faz a diferença.

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Me Salte: Você já sofreu muito assédio? Teve alguma situação que te marcou muito?
Natália: Não posso dizer que sofro muito assédio, pois tenho privilégios sociais que me tornam um alvo menos acessível. Mas, como mulher de modo geral, sim. Existem muitas formas de silenciamentos e sou consciente sobre aqueles que sou vítima. Já fui assediada por um chefe, que maquiava o machismo dele com cavalheirismo e, apesar dos constrangimentos, eu não tinha informações na época para ter respaldo. Então achava que era coisa da minha cabeça. 

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Jornalista pela Universidade Federal da Bahia (Ufba), Naiana Ribeiro, 24 anos, é repórter do CORREIO (BA), jornal líder no Norte/Nordeste – e já fez parte das editorias de economia e cultura, além de ter sido responsável pelas ações nas redes sociais do meio de comunicação e ter experiência em ferramentas digitais. Foi ela quem idealizou e produziu o ensaio fotográfico da campanha Não é Não em Salvador.

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Há cinco anos desenvolve trabalhos na área de empoderamento feminino, autoestima e luta contra preconceitos e padrões de beleza. Além de participar de eventos como palestras e aulas compartilhando experiências enquanto mulher e defensora do movimento body positive, também é editora da PLUS, primeiro veículo para mulheres e adolescentes gordas do país – disponível no site eusouplus.com.NR_028

Pioneiro, o projeto é resultado violências e vivências que cercearam seus direitos durante anos. “Quando eu era criança, sofria muito bullying por questões estéticas, os meninos me davam muitos apelidos, chamavam de ‘baleia’, essas coisas. Mas eu sempre tive amigas que eram presentes e me davam muita força, que ajudavam meus olhos a ficarem abertos para ir contra essas noções sociais que podem mudar a qualquer momento e que impõem ideia para algo que é tão relativo, como é a beleza. Eu ficava chateada, mas sabia me impor, respondia com graciosidade mais do que grosseria, porque assim sempre temos mais razão. Então eu seguia em frente, eu estava sempre sorrindo e mostrava que eles (os que faziam bullying) não tinham poder sobre mim. Eu sempre fui muito aberta, amiga de varias pessoas e acho que isso também me blindava de certa forma. Mas no fundo eu sempre pensava que tinha que emagrecer, olhava as revistas e ficava pensando naquelas imagens. Mesmo quando a pessoa está sorrindo, mostrando que aguenta a barra, as ofensas gratuitas sempre afetam negativamente, causam lágrimas, mesmo que não externas”, conta ela, que é bissexual, e é hoje uma das principais vozes do país quando o assunto é luta contra a gordofobia.

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Seu processo de entendimento do corpo enquanto ferramenta política foi longo – e segue até hoje – envolvendo estudos sobre padrões de beleza, gordofobia e pressão estética: “Isso me ajuda a entender que o problema não está em mim e sim nos outros. O autoconhecimento também é fundamental. Faz parte desse processo de se olhar no espelho, entender o que não agrada e o porquê. Pedir perdão para o nosso corpo pelos maus-tratos e realmente nos conhecer para entender se é algo que a gente realmente não gosta ou se é algo que nos disseram que não era bom. Isso tudo ajuda a entender que o nosso corpo é a nossa morada, nosso lar, a única coisa que efetivamente possuímos nessa vida, e que carrega nossa trajetória”.

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Nas redes sociais, Naiana compartilha diariamente dicas e conselhos com os seguidores – incluindo experiências de vida, produtos de beleza, peças de roupas, gastronomia etc. Seu trabalho mais forte é no Instagram @itsnaiana, onde soma mais de 30 mil seguidores.

Me Salte: Como foi participar das fotos da campanha Não é Não? O que mais te marcou?
Naiana: 
Foi muito gratificante ter idealizado e produzido esse ensaio. Dá um quentinho no coração saber que estamos contribuindo para reforçar e divulgar a mensagem da campanha Não é Não, mostrando que o nosso corpo não é domínio público, que exigimos respeito e que podemos decidir sobre os nossos corpos. Além disso, pudemos comprovar que – com todas diferenças e individualidades – nós, mulheres, somos mais fortes quando estamos juntas. Conseguir juntar mulheres guerreiras diversas e viabilizar uma verdadeira troca de experiências e vivências foi o que mais me marcou.

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Me Salte: Você já sofreu muito assédio? Teve alguma situação que te marcou muito?
Naiana: Já. Boa parte está ligada à fetichização do corpo gordo – ainda visto como objeto de desejo do homem, que quer usufruir dos benefícios sexuais desse corpo, mas não quer assumi-lo publicamente, com medo do que os outros vão pensar. Isso me faz com que viva constantemente desconfiada de qualquer aproximação. Não lembro de alguma situação específica, mas a maior parte com certeza aconteceu no Carnaval: várias vezes já tentaram me beijar à força, puxaram meus braços e cabelo, beliscaram minha bunda e deram tapas nas minhas coxas. Lembro de alguns caras ficarem bravos após eu dizer ‘não’ para eles, e dizerem que eu nunca iria achar alguém que me quisesse porque sou gorda. Como se eu tivesse que ‘aceitar’ qualquer coisa… Muitos homens são muito cruéis, tem zero empatia e respeito.


Saiba como agir em caso de assédio sexual

O que é assédio sexual?
Andar pelas ruas e ouvir um comentário obsceno sobre o seu corpo é um elogio? Ouvir uma cantada no ambiente de trabalho é algo natural? Ser “encoxada” no transporte público faz mesmo parte da rotina das grandes cidades? A resposta para todas essas perguntas é NÃO. Tudo isso é assédio sexual.

O assédio sexual é uma manifestação sensual ou sexual, alheia à vontade da pessoa a quem se dirige. Ou seja, abordagens grosseiras, ofensas e propostas inadequadas que constrangem, humilham, amedrontam. É essencial que qualquer investida sexual tenha o consentimento da outra parte, o que não acontece quando uma mulher leva uma cantada ofensiva.

Porque devemos denunciar o assédio?
Dizer não ao assédio é não aceitar mais que mulheres sejam vistas como objetos sexuais passivos ou como vítimas frágeis do poder dos homens. Dizer não ao assédio é afirmar que as mulheres podem e devem ter controle sobre a própria sexualidade. É mostrar que podemos igualar a voz e o poder da mulher na sociedade, é não submeter as mulheres aos papéis sociais tradicionais.

As consequências
O assédio sexual tem causado impactos sérios e negativos na saúde física e emocional das mulheres. Entre os efeitos negativos relatados pelas vítimas, os mais citados são: ansiedade, depressão, perda ou ganho de peso, dores de cabeça, estresse e distúrbios do sono. Além disso, muitas delas podam sua própria liberdade e seu direito de escolha – deixando de usar uma roupa ou de cruzar uma praça, por exemplo – por medo de sofrer tais abordagens.

A raiz do problema
O que está por trás do assédio não é uma vontade de fazer um elogio. Na verdade, esse comportamento é principalmente uma tentativa de demonstrar poder e intimidar a mulher. E pode acontecer com qualquer tipo de mulher, independente da roupa que ela usa, do local onde ela está, da sua aparência física ou do seu comportamento. Ou seja, a culpa e a responsabilidade pelo assédio é sempre do assediador.

Assédio sexual X paquera
As cantadas ou os assédios físicos não são uma forma de conhecer pessoas para um relacionamento íntimo. Uma paquera acontece com consentimento de ambas as partes: é uma tentativa legítima de criar uma conexão com alguém que você conhece e estima. Por outro lado, o assédio nunca leva a uma intimidade maior.

O sujeito que grita para uma mulher na rua de dentro do seu carro jamais quer ouvir a opinião da outra parte. Ele quer apenas se impor sobre ela. Quem confunde assédio sexual com paquera quer, na verdade, causar confusão justamente para poder continuar a fazer o que quiser sem dor na consciência. Paquera não causa medo e nem angústia. O mais importante é buscar o consentimento e aceitar “não” como resposta.

As roupas das mulheres
É errado achar que uma peça de roupa seja um sinal verde para qualquer tipo de violência sexual, inclusive a verbal. Todos têm o direito de sair de casa da maneira como preferirem, no horário que desejarem e para onde quiserem, sem temer qualquer tipo de abordagem grosseira.

Casas noturnas
Normalmente, as pessoas acreditam que, em casas noturnas, onde o ambiente é mais descontra- ído, é aceitável assediar as mulheres. Essa ideia precisa mudar. O consentimento deve ser dado de livre e espontânea vontade, antes do ato sexual. É importante lembrarmos que o consentimento não é a ausência de “não” ou o silêncio.

O assédio sexual, segundo a lei
O assédio sexual pode ser configurado como crime, de acordo com o comportamento do assediador. Vejamos:

  • Assédio sexual: O assédio caracteriza-se por constrangimentos e ameaças com a finalidade de obter favores sexuais feita por alguém de posição superior à vítima. (conforme Art. 216-A.do Código Penal)
  • Importunação ofensiva ao pudor: é o assédio verbal, quando alguém diz coisas desagradáveis e/ou invasivas (as famosas “cantadas”) ou faz ameaças. Tais condutas também são formas de agressão e devem ser coibidas e denunciadas. (Conforme Art. 61 da Lei nº 3688/1941)
  • Estupro: tocar as partes íntimas de alguém sem consentimento também pode ser enquadrado como estupro, dentre outros comportamentos. (Conforme Art. 213 do Código Penal: Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso)
  • Ato obsceno: é quando alguém pratica uma ação de cunho sexual (como por exemplo, exibe seus genitais) em local público, a fim de constranger ou ameaçar alguém. (Conforme Art. 233 do Código Penal)

O que uma mulher deve fazer quando recebe uma cantada?
Não há um protocolo para essa situação – mesmo porque muitas mulheres afirmam ter medo de sofrer violências piores ao reagir negativamente a uma abordagem.

  • Denúncias formais

Agir imediatamente em locais públicos:

A vítima de assédio sexual poderá denunciar o ofensor imediatamente, procurando um policial militar mais próximo ou segurança do local, caso esteja em um ambiente privado ou transporte público (exemplo: praças, faculdades, eventos, metrô). A vítima deve identificar o assediador, gravando suas características físicas e trajes, ou até mesmo tirando uma foto deste, que em casos recorrentes, poderá auxiliar as autoridades na identificação do sujeito.

Fonte: Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher, Think OLGA (Juliana de Faria, Luíse Bello e Gisele Truzzi), Think EVA (Juliana de Faria e Maíra Liguori)


Veja onde encontrar ajuda em Salvador

  • CRLV (Centro de Referência Loreta Valadares) – Promove atenção à mulher em situação de violenta, com atendimento jurídico, psicológico e social. Endereço: Praça Almirante Coelho Neto, nº1 – Barris, em frente à Delegacia do Idoso. Telefone: 3235-4268.
  • Deam (Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher) – Em Salvador, são duas: uma em Brotas, outra em Periperi. Deam Brotas – Rua Padre José Filgueiras, s/n – Engenho Velho de Brotas. Telefone: 3116-7000. Deam Periperi – Rua Doutor José de Almeida, Praça do Sol, s/n – Periperi. Telefone: 3117-8217.
  • Gedem (Grupo de Atuação Especial em Defesa da Mulher do Ministério Público do Estado da Bahia) – Atua na proteção e na defesa dos direitos das mulheres em situação de violência doméstica, familiar e de gênero. Endereço: Avenida Joana Angélica, nº 1312, sala 309 – Nazaré. Telefone: 3103-6407/6406/6424.
  • Nudem (Núcleo Especializado na Defesa das Mulheres em Situação de Violência Doméstica e Familiar da Defensoria Pública do Estado) – Atendimento especializado para orientação jurídica, interposição e acompanhamento de medidas de proteção à mulher. Endereço: Rua Pedro Lessa, nº123 – Canela. Telefone: 3117-6935.
  • 1ª Vara de Violência Doméstica e Familiar – Unidade judiciária especializada no julgamento dos processos envolvendo situações de violência doméstica e familiar contra a mulher, de acordo com a Lei Maria da Penha. Endereço: Rua Conselheiro Spínola, nº 77 – Barris. Telefone: 3328-1195/3329-5038.
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