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Nininha Problemática escreve novas histórias para o pagodão

Por Vinícius Nascimento*

Digo Santtos sempre quis ser artista. Na infância, recebeu influência de cantoras como Joelma, da banda Calypso, e Ivete Sangalo: ali, ainda sem saber, era plantada uma sementinha de que, mais do que artista, queria fazer arte com algo que gostava, que fizesse parte de sua vida, como o pagode.  

Nininha Problemática é filha dessa mistura e levou o pagode para o meio drag, tão marcado por performances  pop, com artistas como Pabllo Vittar ou Glória Groove. Na semana passada, a cantoa  realizou o sonho antigo de lançar o seu primeiro EP: Pagodrag. Um nome que diz muita coisa. 
Com mais de 200 mil seguidores no Instagram, ela tem expandido suas fronteiras e será uma das atrações da segunda rodada do festival TOCA!, que acontece no pátio do Goethe-Institut sexta-feira (19) , e que promove a música autoral contemporânea brasileira.

O EP tem cinco músicas autorais inéditas: Pala de Marquinha, Calendário, Naquele Esquema, Ao Som do Meu Berimbau e Zuêra. Quem assina a produção é Apache Abdala, nome conhecido  no meio do pagode.

“Esse EP já é um sonho antigo meu, e que finalmente foi concluído, estou trabalhando nele desde agosto de 2021. A demora foi válida porque entreguei um trabalho de qualidade, unindo os dois universos que faço parte”, explica a artista.

Nininha conta que, após uma semana do lançamento, a recepção do público tem sido melhor do que imaginava. Ela  confessa que estava com um pouco de receio antes do lançamento. Mas levantou a cabeça, colocou um cropped para reagir e jogou o trabalho no mundo.

Nininha sabe que “a vida não é um morango” e corpos dissidentes como o dela não encontram facilidade. Ela diz que o pagode é um meio muito machista e homofóbico e quis entrar nele justamente para representar corpos e pessoas que se identificassem com ela. Afirma que quer dar destaque a um grupo maior de pessoas, para além do ‘gay chaveirinho’ ou da mulher como objeto de desejo e sexualização.

“É muito difícil o acesso por conta das letras extremamente heteronormativas. E eu venho contrário disso, com letras que exaltam a feminilidade, o orgulho de ser uma pessoa LGBTQI+”, reflete Nininha, personagem criada em 2017 por Digo, justamente para representar as mulheres da favela, ou as ‘foveiras’, como ele mesmo define.

A própria decisão de entrar para o pagode foi muito pensada antes de sua drag nascer. Nininha também ama o funk e o pop, mas a sua vivência tinha muito mais dendê do que aqueles outros ritmos. “A música baiana é tão rica e diversa e eu pensei ‘porque não eu?’ e decidi que ia lançar um pagodão, misturar com o eletrônico com o pop, fui mesclando tudo, e quando dei por mim, uma brincadeira se tornou o meu grande sonho”, avalia Nininha, que tem músicas com Léo Kret, Pepita e Miguella Magnata.

“É um caminho difícil, o pagodão é muito marginalizado ainda, existe um preconceito. Mas segurei na luta e no meu propósito, porque essa vontade de fazer o pagodão ainda mais conhecido pulsa em mim. O Pagodão é o futuro”, resume .


 Para o show no festival TOCA!, Nininha promete apresentar as músicas novas pela primeira vez e revela que os bailarinos estão ensaiando as  coreografias para entregar a experiência do Pagodrag com toda a excelência e brilho que lhe são característicos. Essa expectativa para ver o público cantando e dançando as novas músicas causam inquietação. 

“Nesse primeiro momento, como tá bem recente o lançamento, o foco é ensinar as letras novas e as coreografias pro público, que serão bem fáceis pra galera poder reproduzir”, garante. Além de Nininha, o TOCA! terá como atração desta edição o cantor cearense Getúlio Abelha. Fruto dos bares e inferninhos da cena alternativa de Fortaleza, ele imprime uma  atitude punk para seu forró eletrônico. 

Questões atuais, políticas, de gênero e críticas ao conservadorismo estão presentes na música, na dança e no audiovisual de Getúlio Abelha. Nos palcos, ele é explosão pura, com figurinos coloridos e impactantes, performances avassaladoras e bailarinos coreografados. Letras ácidas, tom irônico e crítico fazem seu público dançar, refletir e resistir. Ou seja, Nininha e Getúlio são artistas têm trabalhos que se comunicam muito bem.

Esse foi um ponto levado em consideração pela curadoria do projeto, realizada pela Dimenti Produções Culturais. Segundo Jorge Alencar, membro da equipe TOCA!, em todos os projetos da empresa, a prática da curadoria é também um exercício de potencialização da diferença, compreendendo que questões como gênero, orientação sexual, raça, idade e geografia 
atravessam e constituem cada pessoa, influenciado suas suas ações e obras. 

“O TOCA! é motivado, principalmente, pelo desejo de propor contato a um tipo de música que ainda não está muito assimilada ou reconhecida pelas plateias soteropolitanas. Uma aposta no que está surgindo, experimentando, arriscando. Algumas das participações do projeto fazem show em Salvador pela primeira vez. Assim, o TOCA! tem possibilitado uma aproximação com a cidade e seus públicos. Um convite ao novo”, afirma  o curador.

A venda de ingressos para a edição de agosto do Festival está em segundo lote pelo Sympla, custando R$ 60 a inteira e R$ 30 a meia-entrada.


Jorge Gauthier
Jorge Gauthier
Jornalista, adora Beyoncé e não abre mão de uma boa fechação! mesalte@redebahahia.com.br

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