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Mudança do nome em documentos é uma batalha longa de pessoas trans e travestis

João* tem 24 anos é licenciado em História, está estudando bacharelado e fazendo seleção para programas de pós-graduação. Homem trans, ele enfrenta diariamente as pressões e o cerceamento da sociedade pelo uso do chamado nome social – aquele que a pessoa transexual ou travesti quer ser nomeado e se identifica.

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Ele entrou com processo na Justiça para ter seu nome alterado nos documentos e passou por uma grande peregrinação até conseguir. É muito doloroso durante todo o processo porque você está na audiência e a juíza não te entende como João*. Por exemplo, durante todo tempo ela te chama pelo outro nome e reforça um gênero que não é seu. As perguntas da promotora naquele caso foram extremamente desnecessárias e violentas, demonstrando um completo desconhecimento do que eu ou ela estávamos fazendo ali e do que estava sendo julgado.

O reconhecimento do nome social é uma das principais demandas dessa parcela da população que luta pelo respeito à   sua identidade de gênero. Decreto que está em vigor desde o ano passado em todo Brasil determina que a pessoa travesti ou transexual poderá requerer, a qualquer tempo, a inclusão de seu nome social em documentos oficiais e nos registros dos sistemas de informação, de cadastros, de programas, de serviços, de fichas, de formulários, de prontuários e congêneres dos órgãos e das entidades da administração pública federal direta, autárquica e fundacional. Apesar disso, tramita na Câmara Federal, desde o ano passado, um projeto de lei que deseja suspender o direito de transexuais e travestis a usarem seu nome social nos órgãos públicos do governo federal.

Millena batalha no STF

Millena batalha no STF para ter nome alterado Foto: Reprodução

Longa espera
O procedimento para mudança do nome nos documentos oficiais é longo e implica em uma série de transtornos para quem é transexual, travesti ou quem não tem gênero definido. Há pelo menos seis anos Millena Passos luta para ter nos seus documentos o registro do nome que é a sua identidade. Quero que nos meus documentos esteja identificado que meu nome é Millena Passos e que eu sou mulher. Para mim não basta apenas poder usar o nome social. Eu quero isso em documentos. Minha luta de vida é para que meu nome social seja colocado em todos os meus documentos, conta Millena cujo processo que requer isso está em tramitação no Supremo Tribunal Federal (STF).

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Os chamados processos de requalificação civil não exigem que as pessoas façam cirurgias antes da permissão da Justiça para mudança do nome. A Justiça diz isso, mas durante todo processo do trâmite do julgamento é preciso passar por transtornos. Temos que apresentar dezenas de laudos, inclusive psiquiátricos. Todas as vezes que sou chamado no fórum para uma audiência penso em desistir, diz Lucas Dias, homem trans que está com o processo em trâmite há dois anos.

Sou mulher e ponto. Minha identidade política é de mulher trans. Millena Passos é a minha identidade, mas isso incomoda as pessoas,  Millena Passos

Quem também espera para ter o nome social respeitado é Tuka Perez, que tem no seu currículo a atuação como assessora parlamentar. Já dei entrada nos documentos há 11 anos. Hoje já tenho meu nome social no meu crachá do trabalho e no cartão do SUS (Sistema Único de Saúde) e isso é um orgulho, mas infelizmente ainda tenho o nome dito masculino nos documentos oficiais. Vez ou outra tem gente que me chama por esse nome. Eu sinto vergonha. Mas tenho consciência que é mais vergonhoso para quem está me chamando pelo simples fato de não aceitar o diferente. Sempre falo: mesmo que você não me aceite eu exijo que me respeite como pessoa.

Tuka: 11 anos de luta para mudar registros

Tuka: 11 anos de luta para mudar registros Foto: Reprodução

Estudante do curso de Jornalismo, Céu Dórea, de 19 anos, se identifica com uma pessoa não-binária (que não atende nem ao gênero masculino nem feminino) e luta para ter seu nome e sua identidade reconhecida. Nunca fui como os outros meninos. Não queria o que eles faziam: eu queria explorar o universo feminino, mas só me identificava com algumas coisas. Tenho 19 anos, trabalho numa empresa de telemarketing e estou no 3º semestre de jornalismo. Moro com minha mãe, em São Cristovão. Ela vende cosméticos e no início não aceitou bem. Mas hoje até pinta minhas unhas (…) Sei que já perdi oportunidades de emprego. Não gosto de palavras sem gênero porque ninguém enxerga, assim, ou é homem ou mulher. E nosso idioma é pouco neutro. Já fiquei triste por ser preterido em namoro, mas hoje abstraio: não nasci essa bicha maravilhosa pra ficar triste por causa de macho.

Coordenador do Centro Municipal de Referência LGBT de Salvador, Vida Bruno, explica que apesar dos avanços recentes ainda falta muito para o reconhecimento dos direitos civis. As pessoas tem um prazer em chamar as pessoas trans pelo nome que está no registro civil só por maldade. Erik Boson, professor da Faculdade Baiana de Direito, explica que o desrespeito à   identidade de gênero é uma violação de direito e, nesse sentido, a pessoa que não teve o nome social respeitado pode procurar a justiça para fazer com que a instituição em questão seja compelida a adotar uma forma respeitosa de tratamento, diz o professor da faculdade que já permite aos alunxs exercer o direito ao uso do nome social em seus documentos. No caso das faculdades, nenhuma no Brasil emite o diploma com o nome social. Todas ainda colocam o nome que consta no registro civil.

Assista a reportagem:

Me Salte
Me Salte
Identidade Trans Série de reportagens especiais realizada pelo Me Salte, canal LGBT do jornal CORREIO, em celebração ao Dia Nacional de Visibilidade Trans. Matérias e vídeos abordam as vivências de pessoas trans e travestis na busca pelo respeito à  s suas identidades | mesalte@redebahia.com.br

4 Comentários

  1. Jimmy disse:

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