A cantora Daniela Mercury começou sua carreira artística em 1986 quando foi backing vocal da Banda Eva (quando ainda era apenas um bloco carnavalesco). Desde então, rodou o mundo foi e tornou-se pioneira em diversos momentos da sua trajetória. Sempre atenta às questões sociais, a Rainha da Axé Music criou, em 2008,o seu Instituto Sol da Liberdade e é ainda embaixadora nacional da boa vontade do Unicef, título que recebeu em 1995, quando se tornou a segunda personalidade brasileira a receber tal honra.
Mais do que isso, Daniela – que nasceu em Salvador no bairro de Brotas – costuma colocar o dedo na ferida e expor suas opiniões sem temer. Em abril de 2013, casou-se com a jornalista Malu Verçosa e agregou ao seu leque de discursos e enfrentamentos a luta pelos direitos humanos no que tange à liberdade de orientação sexual. Mas, o arcabouço temático da rainha vai além. Em entrevista coletiva para candidatos do programa Correio de Futuro, do jornal CORREIO, nesta terça-feita (26) Daniela falou sobre questões LGBTT, intolerância, racismo e sobre o papel do artista como agente influenciador da sociedade.
O tema da coletiva de imprensa, que aconteceu na Faculdade Social da Bahia, foi ‘A arte e a militância’ e não faltaram perguntas polêmicas. “Eu já fiz isso com bailarinos, com gente que está se profissionalizando para o ambiente de show business e já formei muitas equipes. Nada como a imersão para a gente ter a percepção clara do que quer. A universidade ainda está longe da realidade, então, os jovens precisam participar desses diálogos para estar dentro de um contexto profissional, mais dentro da realidade”, afirmou Daniela que respondeu questões dos candidatos.
O programa Correio de Futuro tem o patrocínio da Odebrecht e apoio da Faculdade Social da Bahia A expectativa é de que os estudantes comecem o estágio em novembro. A entrevista com Daniela foi a segunda fase da seleção.
Confira abaixo as opiniões de Daniela sobre temas sensíveis aos Direitos Humanos:
De que maneira as escolas, através da arte, seja com música, teatro… deveriam abordar a militância, de forma com que as crianças e jovens aprendam a respeitar as diferenças?
(Lara Texeira, estudante de Jornalismo na Unifacs)
As crianças, elas desaprendem a respeitar as diferenças. Se vocês perceberem, uma crianças de 3, 4 anos de idade, elas não ‘distinguem’ as pessoas. Brincam com qualquer criança, até as que falam outra língua. Tem até uma história de duas crianças. Uma criança muito branquinha e um menino negro. Os meninos não tinham se visto antes. Aí um olhou pro outro. Aí ele veio e deu uma lambida nela e disse: ‘você é feita de açúcar’. Aí ela veio e disse: ‘você é de chocolate!’. Então assim, no máximo, o que as crianças enxergam, é um elemento curioso, caso não tenham visto antes na família ou em outros ambientes. Mas elas não vão estabelecer uma hierarquia. A sociedade hierarquizou a cor da pele, a sexualidade.
Você já viu, alguma criança pequena, se tiver um menininho estiver rebolando na frente dela, você acha que ela vai olhar e falar ‘você é bicha, é?’, e vai achar que isso seja uma coisa pior do que o que ela pode ser? Dependendo do ciclo em que ela está, ela pode até repetir um discurso assim, mas ela vai demorar para entender que na sociedade uma bicha é um ser humano considerado menos importante.
Acho que o ser humano vai crescendo, muitas vezes, ficando pequeno, por querer tirar o outro ‘da competição da vida’, e tudo isso vira forma de fazer isso com maquiagens. Quem tá no poder, geralmente é quem determina.
Ninguém é melhor que ninguém por cor de pele, por sexualidade. Tem tanta falta de caráter, tanta corrupção no país, tantas formas injustas pelas quais crescem pessoas no mundo, que não chegam onde estão por esforço, por capacidades.
A gente tem que ser humano, só isso. Sejam bons, respeitosos, éticos, é só isso que a gente tem que ser. Preconceito é educação errada. Já vi gente maltratando bicho, maltratando morador de rua. Não tem motivo. Isso é fazer do outro ‘coisa’. E é esse o problema. É por isso que a arte é maravilhosa: a arte personifica as coisas, e o capitalismo ‘coisifica’ a gente.
O Santander Cultural encerrou sua exposição de Arte Queer, em Porto Alegre, devido à pressão por parte do público conservador. O que você, enquanto artista e LGBT tem a dizer sobre esse tipo de repressão aos movimentos artísticos no meio?
(Renata Oliveira, estudante de Jornalismo da UFBA)
Eu acho que, neste caso, nessa censura, a exposição em Porto Alegre, inclusive os quadros estão sendo expostos em todos os museus de Nova York. É a resposta que os artistas estão dando a toda essa censura. O Rio de Janeiro e outros locais do país estão acolhendo. É inimaginável que um espaço de arte encerra uma exposição por pressões (de qualquer pessoa) dentro de um universo dito democrático. Isso é uma coisa muito provinciana e inaceitável em um país com mais de 220 milhões de pessoas. Inclusive por estarmos a 5, 6 anos pra comemorar o aniversário da semana de arte moderna brasileira, que quebrou censuras e barreiras… No momento em que estamos, de tantas lutas e tantas coisas importantes, a arte pode dizer tudo. Arte não é pra ser bonitinha e nem sempre bela, arte é pra dialogar, questionar e incomodar a sociedade. É pra dizer o que quiser, é uma expressão humana. Ali tinham artistas sérios, inclusive, que já mostraram seu espaço ainda mais nesse universo. É um absurdo.
Mas também acho que tem mais uma questão aí por trás: existe muita gente no Brasil querendo criar inimigos, querendo gerar forças contrárias. São políticos, manipulações da sociedade com tentativas de identificar grupos na sociedade e atirar contra ao invés de tentar uma união; porque assim, a sociedade evoluiu tanto, a liberdade… os países desenvolvidos como os Estados Unidos, com liberdade e democracia, tem em comum conosco essa clareza, esse respeito à democracia, seguindo direitos humanos, com liberdade de casais homossexuais que estão chegando em vários países.
Tem muitas questões LGBT que estão aqui, evoluindo também no Brasil. Enfim, falando nesse grupo de países, isso não é aceitável. E o Brasil se avançou tanto, que quem tá dentro da caixinha e não avançou no tempo, lógico que tá incomodado com esse avanço todo.
Em sua experiência, artistas sofrem retaliação, como perda de contrato e/ou de público, quando manifestam as suas opiniões políticas?
(Caroline Magalhães, estudante de Comunicação da UFBA)
Os artistas sempre foram incômodos. E os que são cidadãos mais presentes, perdem espaço; ganham espaço em alguns ambientes, por quem estuda e os admira. Aqui, por exemplo, estou sendo muito bem recebida, talvez principalmente porque vocês gostem da minha forma de me posicionar; quem sabe até não me contratem pra fazer um show pra jornalistas. Mas podem ter certeza que alguns grupos se afastam por preconceitos.
Até nas minhas redes sociais acho que tem gente que tem medo de comentar, de curtir, por temerem ser identificados como gays. Então, ‘ah, não vou seguir Daniela não, porque ela é gay’, ‘cuidado que isso pega’ (risos).
Malu e Daniela se casaram em cima do trio elétrico. Asssista:
Tem gente que provavelmente pensa assim, que não segue um artista pela arte, pela música deles, mas por uma falsa ideologia do que eles são, porque muitas vezes, identificam aquela pessoa como quem ela é por algo que não determina de fato o todo de quem ela é. Eu jamais chamaria Rita Lee pra uma festa careta…
Você é militante da causa LGBT, embaixadora do Unicef no Brasil, personagem principal da Campanha da ONU Livres e Iguais. Como você faz para mostrar nos seus shows as causas que defende?
(Edielson Silva, da Faculdade Social da Bahia)
Sou eu, gente, é a pessoa lá, inteira. Vou com tudo o que eu sou. Sou a neguinha mais branquinha da Bahia, sou gay, sou essa figura universal, artista. As pessoas sabem quem eu sou, porque eu venho e vou com toda a minha bagagem. Como eu levo a militância pra cima do palco? Eu escolhi fazer música que represente minha cidade, que se atenha à humanidade. Baiano não fala reclamando, a gente não é roqueiro, a gente fala afirmando, a gente fala construindo, a gente fala com ritmo. Até da miséria a gente fala com uma alegria, a gente enxerga os aprendizados, mesmo que mostrando a tristeza e o que precisa mudar.
A gente fala muito mal da gente e isso não puxamos dos africanos, porque africano não fala mal de si assim. Eu sou negra por dentro e falo do racismo, falo dos nossos problemas sociais e das nossas belezas. Nesse último disco, por exemplo, eu fiz uma capa que retratava a foto de um negro lutando contra violência, contra a guerra, uma foto lutando pela paz, contra os preconceitos. Eu ‘repeti’ essa foto com Malu. Faço isso porque além de me casar com Malu, além de ter isso na minha vida, preciso ter na minha arte, porque minha arte sou eu. No disco tem duas músicas pra Malu, inclusive: Maria Casaria e Sem Argumento.
As pessoas se empoderam com essas canções. Eu já trazia o discurso da Pérola Negra comigo, então uso o mesmo empoderamento pra usar e cantar todo o resto. Porque não é assim ‘Pronto, já casou, já disse que é gay, agora fica aí quietinha, viu, Daniela? Porque tá tudo certinho’. Tá tudo certinho nada! Ficar quietinha é hipocrisia nesses casos.
O gay tem muita coisa pra fazer, e não perco chance de usar minha arte. Já tem 30 anos que eu canto sobre machismo, racismo e vim cantando lá de trás. Vou usar meu canto, meu ritmo, porque não quero meu país se achando melhor do que ninguém. E isso não quer dizer perder a autoestima.
Daniela, vi um vídeo seu no programa da Fátima Bernardes, falando de um tema que gerou polêmica no país, a ‘cura gay’. Na sua opinião, o Brasil está vivendo um retrocesso com ‘a cura gay’?
(Demer Gonçalves, da Unime -Paralela)
É a mesma coisa da censura da exposição para mim. É só uma pessoa, na verdade, que trabalha no Congresso Nacional, no gabinete de um deputado evangélico, que se juntou a uma psicóloga que já tinha tido sua licença caçada. Eles se unem pra criar essa tentativa de abrir uma brecha pra ideia de uma reversão de sexualidade. O juiz tentou dizer que aquilo não era preconceituoso, mas não é verdade. Já disseram que a liminar do juiz abre brechas sim para a terapia de ereção. Então um juiz talvez não devesse se meter em um assunto assim, em uma área que não é dele. É o que médicos, por exemplos, apontam, que a justiça não deve julgar sem consultar muito bem uma área de conhecimento se o caso é sobre uma área específica. Agora temos que continuar forçando a barra pra que a gente reverta a decisão.
Mas é sim uma afronta, um desrespeito a toda a comunidade LGBT do mundo, de todo o Brasil, é feito por pessoas que querem constranger os homossexuais do país, retroceder o respeito e as conquistas. É uma questão política. Porque a política fica gerando, nas implicitudes, discursos de ódio, racismo, preconceito, pra poder ganhar espaço e notoriedade em afrontos assim. Mas é impossível não reagir a algo de caráter tão abusivo. Desde os anos 70 o homossexualismo saiu da lista de doenças, isso já estava mais que claro para o mundo, que a nossa sexualidade é múltipla, intensa e caótica, como em tudo em nós: maravilhosamente.
Pablo Vittar foi a cantora drag mais escutada do Spotify em 2017, em contrapartida, o Brasil bateu o recorde em 2016 de mortes LGBTs, com 343 mortes registradas. Comente sobre essas duas realidades vividas no nosso país.
(Gabriel Machado Novaes, da Unijorge)
O Brasil tem dezenas de partidos diferentes, que é uma invenção nossa, porque é tanto partido que nem sabemos quais são todos e nem conseguimos diferenciar direito as diferenças e semelhanças entre eles. É alegado ser assim pela democracia. Então, é uma particularidade do Brasil ser aquele país que ‘aceita tudo’, que ‘na frente’ é aquela festividade, mas que talvez, em lugares escondidos nas ruas, em casa, e em detalhes que ficam mascarados, existem lugares de muita violência, principalmente contra as mulheres, os negros e os gays. A gente tem número importantíssimos de agressão sexual no Brasil, e número expressivos de crianças sendo abusadas, e muitas mulheres tendo seu primeiro coito de forma violenta. A ONU, por exemplo, divulgou há alguns anos atrás, que mais da metade das mulheres na América Latina teriam tido seu primeiro ato sexual de forma violenta, isso é bem duro pra gente. É bem pouco humano, é bem bicho, e nem isso. Precisamos nos educar, nos sensibilizar.
A gente agora tem aí a internet, tem tanta gente no mesmo lugar trazendo mentalidades diferentes, histórias de vidas diferentes, construções sociais diferentes. Todo mundo tá sendo, pra mais ou pra menos, obrigado a pensar um pouco sobre essas coisas. Todos os cidadãos do mundo tem que educar indiretamente os outros para o respeito e convivência pacifica e realmente democrática.
Eu trouxe Pabllo no Carnaval passado pra falarmos de feminismo, sendo muito conhecido ou não. Tá tudo aí, mas fica nas mãos de vocês quebrarem as paredes. O bom é que as artes não tem paredes. Isso nos lembra o quanto o ser humano e a criatividade, em conjunto, trazem possibilidades e forças infinitas. A gente tá aí investigando os outros planetas, mas precisamos lembrar de investigar os planetas fora e dentro de nós, porque com mais autoconhecimento, respeitamos mais a nós e, assim, ao mundo.
Você viu a rainha lacrando com a Pabllo no trio? Aperta o play>
Qual a sua opinião a respeito do funk como manifestação artística e cultural da sociedade brasileira?
(Marialva Conceição, Faculdade da Cidade do Salvador)
Gente, funk é arte? Arte. Não dá pra questionar nada. É uma manifestação legítima. Manifestações dizem muito de nós, da cultura. O que é manifestado artisticamente ou uma expressão artística espontânea, corpórea… Fica aquela discussão do valor da arte, se uma é mais ou se é menos, se interfere negativamente em algo, mas isso é outra discussão, e devemos estudar também filosofia pra pensar sobre.
Funk? Daniela já dançou até com o Dream team do Passinho. Assista>>
Mas em termos de expressão humana, é muito bem-vindo, é legitimo. Cê vai dizer ‘o que é o Ilê?’, ‘o que é o Curuzú?’, é a mesma coisa. Celebrar o funk é celebrar os seres humanos, é forma de análise também. Se incomoda de alguma forma, a gente tem que olhar com cuidados a mais, mas não evitar. Ninguém evita o ser humano. É a nossa sociedade em cada uma dessas expressões.
Em 2017, o Tropicalismo completou 50 anos. Você acha que o Tropicalismo segue fazendo escala na música brasileira?
(Cássio Moreira, da Estácio / FIB)
Eu sou formada pela estrada e doutorado do Tropicalismo. Sem eles eu não seria o que sou, jamais. Eles me formaram como gente, eles que me ensinaram a admirar a liberdade, a me expressar mais livremente. Caetano, Gil, Tom Zé, todos eles e os pesquisadores que vieram reiterando o discurso do manifesto antropofágico. Eu, inclusive, fiz pra esse disco uma música pra São Paulo, chamada Antropofágicos São Paulistanos. É música ‘Canibalista’, porque é como uma exacerbação do termo do Tropicalismo. Eu gosto tanto dessa noção de engolir o mundo.
Villa-Lobos contava uma história sobre ter sido sequestrado por uma tribo de índios canibais. E diziam que as tribos canibais só escolhiam comer quem eles admiravam, então era como uma brincadeira dele. Eu também acho que fui sequestrada por essa tribo baiana, que me engole de tudo o que é jeito. Mas eu também me alimento disso tudo, e é assim que as coisas ficam válidas.
Eu sou tão antropofágica que fiz um projeto chamado Canibália, que já inteirava meu amor pela diversidade cultural brasileira e do mundo todo, não me aperto não. Tem que ter influencias mesmo. Inclusive, uma coisa que os tropicalistas trouxeram: quando eles falam da guitarra elétrica sendo inserida e fazem aquela representação histórica e falam ‘é proibido proibir’, Caetano lembra que quando botou o trio na rua com a guitarra, as pessoas começaram a vaiar, ele dizia que era equivalente ao ‘mal-estar’ que a guitarra eletrica causou no Tropicalismo.
Foi o mesmo que eu fiz com o trio eletrônico. No fundo de todo estranhamento, as pessoas querem ouvir o que já gostam. Mas assim, a essência do Tropicalismo é o movimento antropofágico. Que parece que foi escrito por ETS mesmo, mas é exatamente pra vocês lerem e verem além. Gil tentou explicar o movimento em Geléia Geral, assim: É a mesma dança na sala / No Canecão, na TV / E quem não dança não fala / Assiste a tudo e se cala / Não vê no meio da sala / As relíquias do Brasil: Doce mulata malvada / Um LP de Sinatra / Maracujá, mês de abril / Santo barroco baiano / Superpoder de paisano / Formiplac e céu de anil / Três destaques da Portela / Carne-seca na janela / Alguém que chora por mim / Um carnaval de verdade / Hospitaleira amizade / Brutalidade jardim.
Ouça e sinta Canibália>>
Aí diz a minha música: ‘(…) Antropofágica, tecnológica e soberana. Tem festa, tem festa pra bancário, tem festa pra publicitário, tem festa pra operário, tudo é celebrado, tudo é separado. Protesta professor universitário, protesta comunista revolucionário, protesta agricultor e povo autoritário e pacifista milionário, partidário(…) Quem é que chegou, quem é que transou? Nossas escolas ensinam o samba e as batidas de umbanda e os mestres em sala desfilam de Luanda, elas cortam bandeiras afro-brasileiras, essa nação macumbeira e mestiça. Em samba todo mundo é artista, todo mundo é sambista, todo mundo se deita. Ele encena seu teatro em um terreiro candoblaico(…) Come-se tudo, come-se o mundo, come-se gravura, come-se alegria, come tua língua, são paulistanos, são os paulistanos, antropográficos!’. Sou filha de Caetano e Gilberto.
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PARTE 1
PARTE 2
JOGO RÁPIDO COM A RAINHA EM QUATRO TEMAS
2. RELIGIÃO
‘Quem usa dogmas religiosos pra formular todas as suas relações com a vida, não convive com o planeta, não usufrui os alcances da evolução humana. Tem muita gente que ainda não tem ainda a percepção do quanto o mundo abriu. As religiões são dogmas, são crenças e só interessam a quem a seguem. A população é regida pela constituição, não pela bíblia e nenhum livro sagrado, que devemos respeitar, mas não necessariamente seguir. A gente precisa de cultura, de conhecimento, essa é a verdadeira competência que precisamos: observar e engolir o mundo; é ser antropofágico. O que é brasileiro, negro, estrangeiro, é meu e é seu’.
3. APROPRIAÇÃO CULTURAL
A gente é de um país em que as artes propagam que a apropriação cultural é importantíssima pra que possamos desenvolver olhar crítico e humano, conhecimento. Como é que a gente agora vai vigiar agora quem ‘se apropria da cultura do outro’ se a vida precisa se apropriar de conhecimento para ser mais rica? Então que vigilância maluca. É um atraso. Então é assim, uma geração não sabe direito como foram as conquistas da outra e começam a desdenhar de algumas questões que vieram depois de muitas lutas, discussões, processos graduais. Na minha idade, por exemplo, eu sendo uma feminista, ia querer ficar esperando ‘o noivo’ no baile de debutante? Jamais! Me casei com 19 anos de idades com um homem na igreja católica, mas jamais curti baile de debutante, essa coisinha de colocar ‘a mulher no lugar de comportadinha’, de ser ‘recatada e do lar’. Minha mãe sempre entendeu isso e é muito menos careta do que muitos jovens de hoje em dia. O ideal é que a gente perceba o porquê a gente tá onde tá. Precisamos entender a história pra não desdenhar de conquistas que foram difíceis em esforços e que se refletem em leis e/ou comportamentos.
4. PRECONCEITO E JUVENTUDE
O jovem vem cheio de energia, mas também vem cheio de ignorâncias. É preciso o sonho, a coragem e um pouco de inconsequência sim. Não é sobre desistir e endurecer pelo medo, mas é bom também investigar mais e conhecer mais, sem esses bloqueios pelos ‘lados escolhidos’ como disputas de futebol. Eu digo que, no fundo, sou católica, por isso vou e volto pra esse sentido do divino, meio ‘Avatar’, meio física quântica. Tudo o que me conecta com o mundo, eu quero. Eu sou candomblé, eu sou tudo o que eu puder conhecer, tudo o que me ajudar a compreender da imaginação e vida humana.
Colaboraram Gil Santos e Vanessa Brunt