Parecia comício. As bandeiras do arco-íris foram misturadas com panfletos e bandeiras de candidatas e candidatos a uma vaga na Assembleia Legislativa ou no Congresso Nacional. Esse foi o cenário da edição 2018 da Parada do Orgulho LGBT da Bahia, que aconteceu neste domingo (10) em Salvador. De fato seria maravilhoso se essas candidaturas estivessem abertas ao diálogo anualmente e não somente de quatro em quatro anos para passar uma sensação de que se está ‘apoiando a causa’.
Somente na parte inicial do desfile em uma rápida contagem vi bandeiras de pelo menos nove candidaturas distintas – tanto de partidos de direita quanto de esquerda. Uma candidata, por exemplo, (que eu não vou citar o nome pois é bem isso que os políticos querem) parece que trata os LGBTs como torcida de Copa do Mundo: só aparece de quatro em quatro anos.
A questão é que essa pessoa, por exemplo, já teve cargos públicos e NADA FEZ pela comunidade LGBTs. Abraçar a diversidade não é só pintar a cara da cor do arco-íris e dizer que que apoia os gays. Uma dessas figuras, inclusive, pegou um microfone em um dos trios e disse que era contra o preconceito contra o ‘homossexualismo (sic)’ – foi corrigido rapidamente por um assessor, mas nem conseguiu mais falar ao microfone porque não entendeu o que o assessor falava. Ao final da fala, foi repreendido pelo assessor e disse de pé de ouvido: ‘afe, que difícil essas coisas’.
O apoio do ‘candidato’ é tão fake que sequer sabe usar os termos corretos. Ou seja, não adianta forçar uma essência que não é a sua. Caro, candidato para ‘andar no tempo’ você precisa se informar. Deste 1973 que os Estados Unidos retirou o termo “homossexualismo” da lista dos distúrbios mentais da American Psychology Association, passando a ser usado o termo homossexualidade.
Desde fevereiro de 1985, o Conselho Federal de Medicina aprovou a retirada, no Brasil, da homossexualidade do código 302.0, referente aos desvios e transtornos sexuais. Em 17 de maio de 1990, a Assembleia Mundial da Saúde aprovou a retirada do código da Classificação Internacional de Doenças da Organização Mundial da Saúde. A nova classificação entrou em vigor entre os países-membro das Nações Unidas a partir de 1º de janeiro de 1993.
Dados da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) indicam que em 1999, o Conselho Federal de Psicologia formulou a Resolução 001/99, considerando que “a homossexualidade não constitui doença, nem distúrbio e nem perversão”, que “há, na sociedade, uma inquietação em torno das práticas sexuais desviantes da norma estabelecida sócio-culturalmente” (qual seja, a heterossexualidade), e, especialmente, que “a Psicologia pode e deve contribuir com seu conhecimento para o esclarecimento sobre as questões da sexualidade, permitindo a superação de preconceitos e discriminações”. Assim, tanto no Brasil como em outros países, cientificamente, homossexualidade não é considerada doença. Por isso, o sufixo “ismo” (terminologia referente à “doença”) foi substituído por “dade” (que remete a “modo de ser”).
Um famoso deputado, que concorre a reeleição, resolveu mudar sua plataforma política esse ano para ‘abraçar a diversidade’. Mas parece que o abraço é aquele bem falso (tipo que você dá naquela vizinha do prédio que fala mal de você na noite de Natal). Na sua meteórica passagem pela parada não foi raro vê-lo limpando rosto a cada beijo de batom que recebia. Mais do que isso: usava nomes e termos pejorativos especialmente quando se referia às pessoas trans.
Uma amiga do Me Salte por exemplo foi chamada por ele de ‘traveco’. Obviamente, recebeu um textão em resposta que deixou o candidato com as orelhas mais baixas do que burro em Lavagem do Bonfim.
Há ainda os oportunistas mais descarados que só mandaram seus asseclas e sequer pisaram o pé na parada. Uma candidata, por exemplo, colocou tanta bandeira com seu número que por um momento achei que ela era a madrinha da parada. Tinha pelo menos três equipes de fotógrafos fazendo fotos e vídeos das pessoas com a foto da candidata ao fundo. Será que vai usar isso na campanha? Sim!
E foram rápidos: quando eu cheguei em casa já havia um álbum no facebook com as carinhas. Um detalhe: a candidata nem estava em Salvador. A ‘ação de marketing’ pegou mal. Quando perguntei a um dos seus assessores onde estava a candidata que não estava ali, ele foi logo desconversando. Quando questionei qual projeto para os LGBTs ela havia apresentado no tempo que estava em Brasília, ele nem soube o que falar.
Todas essas histórias que me referi são de candidaturas de pessoas heterossexuais. É preciso que nós LGBTs tenhamos discernimento e olhos bastante abertos com esses falsos apoios. Há problemas também com candidaturas de pessoas LGBTs que passam a falsa sensação de apoio a causa. Não é só porque você é LGBT que você deve se credenciar a receber nossos votos. É preciso mostrar, demonstrar e fazer valer a nossa voz e os nossos direitos.
Obviamente que no meio da parada havia pessoas sérias que são engajadas na causa. É nessas pessoas que precisamos confiar e apostar. É preciso PESQUISAR e não votar em uma pessoa só porque ela botou uma bandeira colorida nas costas no dia da parada.
Estamos num momento de transformação do Brasil. Precisamos de políticos que nos apoiem de forma verdadeira para enfrentar a bancada da Bíblia e da Bala nas casas legislativas. Não se pode dizer que se apoia uma causa somente da boca para fora. Nenhum desses candidatos que me referi nesse texto tiveram ações nas últimas três paradas.
Ontem, eles apareceram mais do que os patrocinadores do evento e do que os clássicos batedores de carteira e celulares que sempre vão para parada para roubar os LGBTs. Esse ano eles até existiram (em número bastante menor). Talvez tenham ficados ofuscados pelos ‘ladrões de voto’.
Um aviso: anotei todos os nomes e fiz foto de todos candidatos que estavam fazendo campanha ontem lá. Ano que vem vou bater a lista e fazer uma chamada para ver quem aparece por lá!