A Bahia é o segundo estado em número de mortes violentas de pessoas LGBTs. O dado consta em estudo divulgado nesta quinta-feira (23) pelo Grupo Gay da Bahia (GGB) que há 40 anos desenvolve o Relatório Anual de Mortes Violentas de LGBT no Brasil. O GGB computa dados de matérias jornalísticas em todo Brasil.
De acordo com o relatório, em 2019, 329 LGBT+ (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais) tiveram morte violenta no Brasil, vítimas da homotransfobia. Foram 297 homicídios (90,3%) e 32 suicídios (9,7%).
“Comparativamente aos anos anteriores, observou-se em 2019 surpreendente redução das mortes violentas de LGBT+. O ano recorde foi 2017, com 445 mortes, seguido em 2018 com 420 e agora 329 mortes em 2019, registrando-se, portanto, uma diminuição de 26% face a 2017 e 22% em relação a 2018”, explica parte do estudo.
Essa tendência de redução de mortes violentas foi observada em todo Brasil no ano passado, 19%, conforme dados oficiais do Monitor da Violência (G1 e GLOBO NEWS, 2020), e confirmada igualmente pela Associação Nacional de Trans, que apontou uma queda de 24%.
De acordo com o professor Luiz Mott, fundador do Grupo Gay da Bahia e um dos pesquisadores do projeto, a explicação mais plausível é um ‘acautelamento da população LGBT’ em função do atual momento democrático do país.
Segundo o Domingos Marcelo Oliveira, coordenador desta pesquisa sobre mortes violentas de LGBT+ no Brasil, “além da nossa hipótese de que as mortes diminuíram devido ao maior resguardo e cautela da população LGBT em relação ao clima hostil dos últimos tempos, há outras tentativas de explicação. A Associação de Travestis considerou que os LGBT ficaram aterrorizados com medo de registrar casos de violência homotransfóbica; há ainda a hipótese que a criminalização da homofobia, equiparada ao racismo, teria inibido potenciais assassinos. “
A cada 26 horas um LGBT+ é assassinado ou se suicida vítima da LGBTfobia, o que confirma o Brasil como campeão mundial de crimes contra as minorias sexuais. Segundo agências internacionais de direitos humanos, matam-se muitíssimo mais homossexuais e transexuais no Brasil do que nos 13 países do Oriente e África onde persiste a pena de morte contra tal segmento. Mais da metade dos LGBT assassinados no mundo ocorrem no Brasil .
“Apesar dessa redução observada nos dois últimos anos, devemos pontuar que tais mortes cresceram incontrolavelmente nas duas últimas décadas: de 130 homicídios em média em 2000, saltou para 260 em 2010, subindo para 398 nos últimos três anos”.
Síntese e Tendências predominantes das mortes violentas de LGBT+ do Brasil em 2019
- 329 LGBT+ foram as vítimas de morte violenta no Brasil em 2019.
- 297 homicídios (90,3%) e 32 suicídios (9,8%).
- Como se repete desde que o Grupo Gay da Bahia iniciou tal pesquisa, em 1980, em termos absolutos predominaram as mortes de 174 Gays (52,8%), seguidos de 118 Travestis e Transexuais (35,8%) , 32 Lésbicas (9,7%) e 5 bissexuais (1,5%).
- Em termos relativos, as pessoas trans representam a categoria sexológica mais vulnerável a mortes violentas. Esse total de 118 mortes, se referidas a 1 milhão de travestis e transexuais que se estima existir em nosso país, sinalizam que o risco de uma pessoa trans ser assassinada é aproximadamente 17 vezes maior do que um gay.
- Quanto à faixa etária das vítimas, nos extremos foram computados 5,8% menores de 20 anos e 3,9% idosos com mais de 60, representando 90,7% os LGBT+ mortos entre 20-50 anos, a mais jovem, com 14 anos, uma lésbica estudante encontrada morta com sinais de tortura numa praia de Paulista, (PE) e o mais velho, um aposentado de 69 anos, morto a facadas e tiros em Madaguaçu (PR).
- Quanto à cor, apesar de se tratar de variável bastante descuidada nas matérias jornalísticas, encontramos praticamente a mesma distribuição racial entre as vítimas, 50,2% de negros (pardos e pretos) para 49,7% de brancos.
- Foram identificadas 60 profissões-ocupações entre os LGBT+ vítimas de morte violenta, salientando-se as profissionais do sexo (11,5%), professores (7,3%), estudantes e cabeleireiros (5,1% respectivamente). Predominam profissionais do setor terciário e prestação de serviços, incluindo 7 pais de santo, empresários e servidores públicos.
- Relativamente à causa mortis dos LGBT+, 29,4% foram assassinados a facadas, 21,8% com arma de fogo, incluindo estrangulamento e espancamento muitas vezes precedidos de tortura e agravados com a carbonização do corpo.
- 1/3 das mortes violentas de LGBT+, sobretudo de gays e lésbicas, ocorreram no interior da residência vítima, enquanto as trans, especialmente as profissionais do sexo, foram executadas na “pista”, no centro urbano, mas também em estradas e locais ermos.
- Quanto ao perfil regional das mortes violentas de LGBT+, registrou-se uma mudança imprevisível do padrão observado nos últimos anos: o Norte e Centro Oeste deixaram de liderar essa lista, voltando o Nordeste (35,5%)a ser a região mais homotransfóbica do país e pela primeira vez o Sudeste (29,7%)ocupando o segundo lugar. O Sul e Centro Oeste foram as regiões com menor índice de letalidade anti-LGBT, repetindo a tendência dos anos anteriores.
- Registraram-se mortes violentas de LGBT+ em todos os 26 estados e no Distrito Federal, distribuídos em 200 municípios, 32 localidades a menos em relação a 2018.
- São Paulo é o estado que aparece em primeiro lugar no ranking de mortes, com 50 casos, (15,2%), seguido da Bahia, com 32 ocorrências (9,73%) e Pernambuco com 26 casos (7,9%). No outro extremo, os estados menos violentos foram Acre, Amapá e Mato Grosso do Sul, com 1 morte violenta. As capitais mais violentas foram Salvador (12 casos), São Paulo (11), Rio de Janeiro (7), Belo Horizonte e Fortaleza (6), Curitiba e Recife (5).
“A matança continua, diz o Presidente do GGB, Marcelo Cerqueira: “nos cem primeiros dias de 2020, já foram documentados 102 mortes violentas de LGBT no Brasil, 91 homicídios e 11 suicídios. Esperamos que com o confinamento social e o medo de contaminação pelo Covid-19 redunde na diminuição dessas mortes violentas muitas vezes ocorridas na rua ou no entremeio de relações sexuais.”