Alan Di Assis*, especial para o Me Salte

O início da minha quarentena foi quase insuportável porque a minha sexualidade não é aceita pelos meus pais. Senti-me sufocado tendo que me anular o tempo todo, sem poder ser quem eu realmente sou. Achava que à medida que o tempo passasse as coisas iriam piorar e eu iria surtar mais, mas encontrei formas de lidar com essa convivência extrema e amenizar os efeitos disso tudo em mim. Organizei os meus métodos e agora compartilho com quem precisa. Espero que faça sentido!

Dica 1: ACHE O SEU CANTO.

Casa e lar são dois conceitos diferentes. Casa é habitação, matéria, estrutura física; lar é acolhimento, aconchego, amparo emocional. A casa é conforto para o corpo, o lar é conforto para a alma. Se a sua casa é hostil, encontre o seu refúgio nela…

O seu quarto pode ser o seu esconderijo, ou, caso você divida o quarto com outra pessoa, você pode escolher outro lugar… uma varanda, um espaço no quintal. De repente, mesmo que divida o quarto, a sua cama pode ser o seu ponto de paz.

É essencial arrumar seu canto do seu jeito. É importante que este lugar seja tudo que a sua casa não é: aconchegante, acolhedor… que seja a sua cara, que você se sinta bem em estar ali. Então, ajeita esse espaço direitinho para que você possa se refugiar e ter o mínimo sentimento de ter um lar dentro dessa casa.

Dica 2: CONSUMA ARTE E INFO (principalmente LGBTQIA+).

É natural que a gente se anule quando estamos perto de pessoas lgbtfóbicas. Conviver com “lgbtfóbicos que amamos” (família e afins) é cruel… nós esmagamos nossa essência e sofremos por ter que incorporar outra persona. Nessa interpretação, podemos começar a acreditar nas coisas ruins que nos dizem.

Por isso, é essencial consumir conteúdos que reforcem as nossas identidades LGBTQIA+ e nos lembrem que não há absolutamente nada de errado conosco, mas, sim, com aqueles que não nos respeitam/aceitam. Podem ser vídeos no YouTube, filmes, séries, livros, músicas… tudo que lhe ponha em contato com você mesmo, com a sua personalidade e essência. Tem muita coisa boa. Consuma informação de maneira cuidadosa. Priorize sua saúde mental. Estamos lutando para sobreviver, certo?

Dica 3: EVITE CONFLITOS E TENTE APROXIMAÇÃO.

Só conviva com essas pessoas que são tóxicas para você pelo tempo que for necessário! Sempre que possível, prefira o seu canto… aquele que você arrumou para se refugiar. Quando for necessário conviver, evite temas e discussões delicadas e conflituosas. Falar sobre o governo, por exemplo, pode ser desgastante. Não é uma boa ideia. Evite esses assuntos e se, mesmo assim, eles surgirem, saia de perto. Sorria, acene e saia de perto. Melhor ter paz do que ter razão. Já sabe, né? Corre para o seu canto e usa a “dica 2” ou “dica 5”.

Também é importante buscar afinidades. Novelas, filmes, jogos, refeições… crie conexões e deixe-os ter contato com a pessoa incrível que você é. É importante que eles convivam com você e percebam que a sua sexualidade é só mais uma das suas tantas características que lhe tornam único e insubstituível.

E seja útil. Não dê motivos para reclamarem. Não fique só acomodado no seu canto. Limpe/arrume a casa, cozinhe, ajude no que for preciso… essa colaboração é necessária para uma boa convivência em grupo. Não adianta ficar “encostado”, gerar um mal estar por indisposição e falta de participação na rotina e dizer que é lgbtfobia, certo? Precisamos lutar por nossos direitos enquanto cumprimos nossos deveres. Faz a sua parte!

Dica 4: PLANEJE.

Aproveite todo esse tempo ocioso para traçar planos, metas e estratégias para dominar o mundo, o seu mundo. Pense em como conquistar independência financeira e sair de casa para ter o seu próprio lar. Dê uma repaginada no currículo, cogite a ideia de empreender. Aprenda algo novo que te impulsione nesse projeto… qualquer coisa.

Além de planejar os próximos passos mais decisivos e importantes, planeje também a primeira coisa banal que vai fazer pós-quarentena. Você está sufocado há tanto tempo, o que vai querer fazer para extravasar? Encontrar pessoas que te façam sentir bem em ser quem você é e dar um rolê? Ir a uma festa, uma praia, dançar, beber, rir… pense nisso e alimente a esperança em dias melhores!

Dica 5: CRIE E REFORCE A SUA REDE DE APOIO.

Essa deve ser uma das dicas mais importantes. Para os LGBTQIA+, ter uma rede de apoio é vital para a existência e sobrevivência. Cercar-se de pessoas que lhe amem e apoiem é fundamental para seguir em frente e permanecer forte. Sua rede de apoio pode ser formada por amigos, parentes, até por desconhecidos que, perto ou longe, estão lutando por você e por causas que lhe representam. Essas pessoas podem ser parte da comunidade LGBTQIA+ ou não. É necessário ter com quem contar em momentos difíceis. Se precisar desabafar ou fugir, tenha pessoas que possam lhe ajudar por perto.

É isso! Seja gentil consigo e respeite o seu tempo. Chore, se precisar. Cuide-se. Hidrate-se, alimente-se, durma e fique bem. Fique em casa! Isso vai passar!

Essas dicas surgiram na quarentena, mas são válidas para além dela. Então, se elas te ajudarem, conta para mim… e se você tiver outras dicas para compartilhar, eu também quero saber. Você me encontra no Instagram: @alandiassis. Estou disponível caso precise conversar também.

Ah, talvez não seja a melhor hora pra sair do armário…

*jornalista, militante, pesquisador e produtor de conteúdo das relações entre homoafetividade e protestantismo/evangelho

24 de abril de 2020

Dicas para pessoas LGBTQIA+ que estão em quarentena com a família LGBTfóbica

Alan Di Assis*, especial para o Me Salte O início da minha quarentena foi quase insuportável porque a minha sexualidade não é aceita pelos meus pais. […]