Não, não iria para Rússia nem que me pagassem. Não há patriotismo que valha minha dignidade de pisar os pés num país que não respeita os direitos humanos. Mais do que isso: não há ser na  Via Láctea que me convença que o maior torneio esportivo de futebol do mundo  – mesmo que seja um espaço onde o machismo é forte – merecesse ser feito num país onde  as pessoas LGBT+ possam sequer trocar afeto em público. Lá isso é crime!

Não, você não leu errado. A Rússia,  que receberá entre junho e julho a Copa do Mundo, é um dos países mais LGBTfóbicos do mundo. Cerca de 60 mil brasileiros já compraram ingressos para assistir aos jogos da Copa do Mundo na Rússia. Para evitar que imprevistos prejudiquem a viagem dos turistas ao principal evento de futebol do planeta, o governo brasileiro preparou, em versões impressa e digital, o Guia Consular do Torcedor Brasileiro. 

Neste guia, pelo tipo de absurdo que é descrito como lei no país, fica claro que nenhum LGBT+ deveria sequer pisar os pés por lá. Além de trazer informações úteis para o viajante desfrutar dessa experiência única, o guia pode ajudar o brasileiro a evitar situações indesejadas em um país com tradições culturais diversas do Brasil como, por exemplo, pagar multa e ser deportado por “demonstrações homoafetivas em ambientes públicos”, que pode ser enquadrado como “propaganda de relações sexuais não tradicionais feita a menores”, segundo a legislação local.

É esdrúxulo, imbecil e cruel dizer que a presença de afeto entre pessoas do mesmo sexo pode ‘influenciar negativamente crianças’. O afeto, na verdade, deveria inspirar mais afeto.

RUSSIA

O guia sugere também que se evite manifestações públicas sobre temas políticos, ideológicos e sociais. Até mesmo o uso de bandeiras estrangeiras em praças e edifícios públicos podem resultar em problemas para o brasileiro desavisado. Nesse caso, a pena é bem menor, restrita à apreensão do símbolo.

Segundo a diretora do Departamento Consular e de Brasileiros no Exterior do Itamaraty, embaixadora Luíza Ribeiro Lopes da Silva, a expectativa é de que regras como essas não sejam aplicadas a todos os turistas de forma absoluta. “No entanto, nosso papel [por meio desta cartilha] é preventivo, no sentido de evitar problemas para os brasileiros que participarão do evento”, disse ela durante o lançamento da publicação, no Ministério das Relações Exteriores à Agência Brasil.

Fico aqui pensando o motivo dessas regras da Rússia! As que se referem ao afeto são restritas apenas aos LGBT+. Imagine só se Neymar fosse gay que putaria seria se ele beijasse um boy na hora de comemorar o campeonato.

O que me deixa mais reflexivo é que, depois que essas notícias foram divulgadas, ouvi muitas concordâncias aqui mesmo em solo brasileiro. Falamos na LGBTfobia do lado de lá, mas por aqui – apesar de não ser lei – é um comportamento comum ser preconceituoso e escroto no respeito à orientação sexual quando se está falando do mundo esportivo. Aqui no nosso quintal UM LGBT+ É MORTO POR DIA POR CONTA DA LGBTFOBIA.

Mas na Rússia o buraco é literalmente mais fundo.  Apesar das relações homoafetivas terem adquirido uma série de vitórias nos últimos anos em todo mundo ser LGBT+ ainda é considerado crime em 72 países. Em oito deles, a manutenção de relações homoafetivas pode levar até mesmo a morte, segundo o relatório mais recente da Associação Internacional de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Transexuais e Intersexuais (Ilga). Na Rússia pode haver prisão e, no caso de estrangeiros, podem ser deportados.

Em função do sistema político de exceção que perdura desde a época da União Soviética na caça das pessoas que saem dos padrões ditos heteronormativos não é possível quantificar a quantidade de pessoas que já foram mortas na Rússia por serem LGBT+. Em 2015, por exemplo, quando o mundo já havia se despedido da copa no Brasil e já se olhava para o território russo houve um massacre de LGBT+ que faziam um ato pela liberdade. Várias pessoas foram agredidas e espancadas em praça pública.

Para todxs LGBT+ que gostam de futebol e que vão pra Rússia sugiro respirar a paz e tomar cuidado para não virar estatística. Mais do que isso: sugiro trocar as passagens e ir curtir férias em um lugar mais aprazível. Melhor não ir para Alemanha para não serem zuados pelo  fatídico 7 a 1?!  Que tal a Itália?! Nem vão jogar na Copa, tem comida boa, paisagens incríveis e uns boys magyas.

PS: Em 2022 , a Copa da vai ser no Catar, um dos cinco países do mundo em que a pena de morte é tecnicamente permitida por uma interpretação da lei islâmica (sharia), ainda que não seja oficialmente aplicada, para pessoas LGBT+. Os outros países são: Paquistão, Afeganistão, Emirados Árabes Unidos e Mauritânia. Ou seja, que tal fazemos uma campanha para a Copa ser pra sempre no Brasil #saudadesdafanfest (mas aí é assunto para outro texto). 

7 de junho de 2018

Nenhum LGBT que se preze deveria pisar na Copa do Mundo da Rússia

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