A Bela homenagem de Rodrigo Faour a Agnaldo Timóteo – Blog do Marrom

A Bela homenagem de Rodrigo Faour a Agnaldo Timóteo

A Bela homenagem de Rodrigo Faour a Agnaldo Timóteo

Com a devida autorização do autor, Rodrigo Faour, intermediada pelo querido Arlon Souza, publico o belo texto que ele escreveu sobre Agnaldo Timóteo que nos deixou hoje, vítma da Covid 19 mesmo já tendo tomado as duas doses da vacina. Mesmo sendo esnobado pela chamada “crítica especializada” Agnaldo foi um artista de grande popularidade e cantava muito.
“AGNALDO TIMÓTEO era um cantor expressionista. Não era para todos os ouvidos. Sua figura pública também, muito contraditória, era execrada por muitos. Pagava para entrar numa briga e nem sempre falava do que entendia. Mas também sabia fazer mea culpa. Se desculpava, votava atrás, muitas vezes. De torneiro mecânico a astro popular, venceu em 1965, mesmo sendo um homem negro, brigão e homossexual – jamais assumido – como Oswaldo Nunes. Contudo, foi muito mais longe que o colega, mesmo com todo os preconceitos velados ou declarados. Seu sucesso popular sempre foi avassalador. Isso é inconteste. Numa conversa recente com o filho de Erasmo, Leo Esteves, dono do selo cult Coqueiro Verde, me confidenciou que o DVD de 50 anos de careira do cantor foi o produto mais vendido de sua gravadora, de longe. Imaginem no auge da carreira.
Como político sempre se preocupou em ajudar a quem precisava, independente da corrente partidária a qual estava vinculada. Fora da mídia, falava de seus amores com naturalidade e estava sempre duro, porque tirava do bolso qualquer quantia para ajudar amigos, familiares, amantes e inclusive colegas do meio artístico. Cauby, por exemplo, em sua pior fase financeira teve uma boa parte de um sério tratamento de saúde pago por ele.
Passional e contraditório, mas um amante de sua arte acima de qualquer coisa e passava essa verdade a ouvidos acima de qualquer suspeita. CAETANO já declarou que ele era o cantor preferido de sua mãe, Dona Canô.
O autor de “Galeria do amor”e “Eu, pecador”, libelos homossexuais, ao declarar no documentário de Nelson Hoinneff seu amor por um de seus musos inspiradores – um homem casado com mulher e filhos a tiracolo, presente na pré-estreia -, viu o cara se aborrecer e ir embora. Não teve dúvida, abandonou também a sala de cinema e foi atrás dele. Era o mesmo que num programa de TV ao ser tratado de gay, disse: “Não sou gay, sou Agnaldo Timóteo”. Isto era TIMÓTEO!
Nunca fui tão fã do cantor como fui de outros de seus contemporâneos, nem conheço a fundo seus discos. Gostava mesmo do LP que gravou com ANGELA MARIA em 1979, espetacular. Ali o repertório clássico e sua interpretação mais dosada me conquistaram. Com o tempo, entretanto, passei a admirá-lo devido a seu bom coração e por ser uma pessoa transparente, que falava o que pensava, acima de patrulhamentos, mas, no caso dele, até com certa ingenuidade. Sem se dar conta que hoje vivemos uma outra cultura, um outro tempo em que as figuras públicas pagam preços (e processos) muito maiores que no passado por declarações inconsequentes, feitas no calor da hora, sem pensar. Concordava e discordava dele com a mesma frequência e ficava pasmo em ver como ainda estava vivo e relevante, mesmo enfrentando tanta gente e, na música, passando por tantos modismos. Era muito impressionante.
Afinal, o que fica desta vida? A obra e o amor que ele dedicou a tanta gente. Hoje a Covid-19 nos tirou um ídolo popular e uma personalidade que ainda merecerá dos historiadores muita análise, discussão e reverência. Um brasileiro que, querendo ou não, entrou para a história de nosso tempo e diz muito das nuances e gostos da sociedade brasileira.
Rodrigo Faour, 3/4/2021
É jornalista, produtor musical e historiador de música brasileira, autor de seis livros, entre os quais, “História sexual da MPB”, “Dolores Duran – A noite e as canções de uma mulher fascinante” e “Angela Maria – A Eterna Cantora do Brasil” (todos da Ed. Record).